Sanskrit & Trika Shaivism (English-Home)

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 O Paramārthasāra de Abhinavagupta: Estrofes 12 a 15 - pura

Tradução pura


 Introdução

O Paramārthasāra continua com mais quatro estrofes. Esse é o quarto conjunto de estrofes, que é composto de 4 das 105 estrofes que constituem a obra como um todo.

Obviamente, também inserirei as estrofes originais sobre as quais Yogarāja está comentando. Escreverei várias notas para que esse livro fique tão compreensível quanto possível.

Leia o Paramārthasāra e experimente Supremo Ānanda ou Divina Alegria, querido Śiva.

Este é um documento de "tradução pura", isto é, não haverá nenhum Sânscrito original, mas, às vezes, existirá uma quantidade mínima de Sânscrito transliterado na própria tradução do texto. Obviamente, não haverá nenhuma tradução palavra por palavra. De qualquer maneira, haverá Sânscrito transliterado nas notas explicativas. Se você for uma pessoa cega usando um leitor de tela e não quiser ler as notas, ou simplesmente quiser pular as notas, clique no respectivo "Pular as notas" para continuar lendo o texto.

Importante: Tudo o que está entre parênteses e em itálico dentro da tradução foi agregado por mim para completar o sentido de uma determinada frase ou oração. Por sua vez, tudo o que está dentro de um duplo hífen (-- ... --) constitui informação esclarecedora adicional também agregada por mim.


Obrigado a Paulo & Claudio que traduziram este documento do inglês/espanhol para o português brasileiro.


Ao início


 Estrofes 12-13

Uma objeção: Portanto, com relação ao que foi explicado (desta forma:) "O universo brilha em tal Paratattva --o Mais Alto Princípio--", como isso pode ocorrer enquanto nada pode manifestar-se como diferente em relação ao Mais Alto Princípio? (Porque,) se o universo se manifesta --aparece-- como diferente Dele --do Mais Alto Princípio--, então (há) rejeição da doutrina da não dualidade. (E,) se, em unidade (com esse Mais Alto Princípio), "o universo se manifesta", (então) como (pode haver) uma fala apta ou adequada? --visto que soa contraditório dizer que o universo está em plena unidade com o Senhor Supremo (uma declaração que indica não dualidade) e que, ao mesmo tempo, manifesta-se (uma declaração que indica dualidade)--. Dessa forma, mostrando através de um exemplo que o (Mais Alto) Princípio é dual (e) não dual em relação a isso --ao universo--, (Abhinavagupta,) com o propósito de reconciliar diferenças relacionadas a essa (aparente contradição), disse1 :


Assim como a variedade (composta de) uma cidade, uma aldeia, etc., quando refletida em um espelho, (embora) não seja diferente (do espelho), aparece como mutuamente diferenciada --como uma cidade, uma aldeia, etc.-- e também (como diferente) inclusive do (próprio) espelho, da mesma forma, este universo, ainda que não seja diferente da Consciência do extremamente Puro Paramabhairava --o Supremo Bhairava ou Śiva--, aparece como mutuamente diferenciado e também (como diferente) inclusive Dele Mesmo||13||


(A frase inicial "Darpaṇabimbe yadvannagaragrāmādi citram" na estrofe 12 significa:) Assim como (quando) toda a múltipla variedade (composta de) uma cidade, uma aldeia, uma fortaleza, uma torre de vigia nas muralhas (dessa fortaleza), as terras (que a rodeiam), um rio, uma corrente, um fogo, uma árvore, uma montanha, um animal doméstico, um pássaro, uma mulher, um homem, etc. aparece —com as próprias características específicas --ou seja, cada uma dessas coisas que formam a variedade múltipla conserva as suas características--— refletida em um espelho límpido. (A palavra "avibhāgi", na mesma estrofe, significa: Embora tal variedade seja) "avibhāgi", (isto é, embora) brilhe (ou) exista como não diferente do espelho, (em outras palavras, embora) lance (a sua) forma --uma cidade, uma aldeia, etc.-- dentro (do espelho) em unidade com ele --com o próprio espelho--. (E), mesmo que (essa múltipla variedade) apareça em unidade em relação a isso --ao espelho--, aparece "vibhāgenaiva ca parasparam" --tal como Abhinavagupta diz na estrofe 12--, (isto é,) aparece (repleta) de diferenciação "conservando mutuamente as próprias características específicas, (p. ex.:) um tecido é diferente de uma panela (e) uma panela é diferente de um tecido"2 .

Indubitavelmente, os objetos que residem dentro dele --dentro do espelho-- são mencionados como diferentes (entre si), mas, por não terem abandonado o espelho, nada que seja diferente (do próprio espelho) é percebido (realmente. E, como resultado,) ainda que o universo permaneça, apesar disso, em unidade indistinguível com o espelho, é percebido como diferente em qualquer lugar.

Dessa forma, "o espelho que contém o reflexo de uma panela, etc., é, então, escondido --torna-se invisível-- (por essa reflexão) ". "Isso não (é assim)" (porque Abhinavagupta) disse (no final da estrofe 12): "darpaṇādapi ca" (ou) "e (como diferente) inclusive do (próprio) espelho" (para indicar que o espelho não desaparece devido à presença dos reflexos na sua superfície).

Não somente os próprios objetos que residem dentro do espelho aparecem como diferentes (entre si), mas inclusive (parecem ser) diferentes do espelho também. Como consequência disso, o espelho, ainda que esteja repleto de diversos reflexos, brilha com uma natureza essencial que transcende esses reflexos. No entanto, ele --o espelho-- não se torna idêntico a eles --a esses reflexos--, já que existiria a percepção (de que:) "Não há nenhum espelho".

Contudo, inclusive durante a percepção de diversos reflexos (na superfície de um espelho), o conhecimento (de que) "isto (é) um espelho" permanece irrefutável para todos.

Inclusive (um grupo de objetos) como uma panela, etc., não particulariza ou distingue o espelho de modo que ele --o espelho-- apareça aqui (como se estivesse) desprovido da própria natureza essencial (desta forma:) "Este (é) um espelho-panela, este (é) um espelho-tecido" --em outras palavras, nenhum desses reflexos faz com que o espelho seja algo diferente de um espelho--.

Nem a dualidade ou diferença criada por espaço (e) tempo vai aniquilar a natureza essencial em relação a isso --ao espelho-- --ou seja, o espelho permanece o mesmo apesar da dualidade criada por espaço e tempo, que toma a forma de múltiplos objetos que são mutuamente diferentes e que estão mudando a todo momento--.

Como consequência, "O espelho, portando diversos reflexos em si mesmo, (é) somente o espelho" --o espelho nunca se torna nada mais, apesar dos múltiplos reflexos sobre a sua superfície--, (e, como resultado,) não há nenhuma destruição ou eliminação da doutrina da reflexão --isto é, essa doutrina postulada por Abhinavagupta não tem nenhuma falha porque o espelho permanece sempre como o espelho, isto é, o Ser é apenas o Ser, ainda que este universo multicolor esteja sendo refletido em Si Mesmo como se Ele fosse um Espelho--.

Então, diz-se (que pode existir) essa dúvida ou confusão: (De acordo com a doutrina da reflexão,) deve-se considerar que "Um elefante (reside) em um espelho". Ainda assim, certamente não há nenhum (residindo) no espelho. Isso é assim por causa da ausência de atividade por parte do objeto (dentro do próprio espelho, ou seja, o objeto não está realizando nenhuma atividade dentro do espelho, mas sim fora. Yogarāja, o comentarista, especifica que) "Esse (tipo de) opinião ou assertiva (é provocado) por uma confusão, certamente". Então, (apesar dessa confusão,) o exemplo baseado na doutrina da reflexão (é), sem dúvida, bem-sucedido --mas Yogarāja ainda não está explicando a natureza de tal confusão... continue lendo, por favor--. Examina-se a natureza (dessa) dúvida ou confusão logo em seguida.

--Agora, Yogarāja procederá a explicar a 13a estrofe, fragmento a fragmento-- "Tadvat", (isto é,) "ainda assim", por meio do exemplo (que lida com) o reflexo de uma cidade, etc., em um espelho, "jagat" (ou) o universo, embora não seja diferente da Consciência do extremamente Puro Paramabhairava --o Supremo Bhairava ou Śiva--, que é a Luz abundante em Perfeita Alegria (e) que está proeminentemente desprovido de toda conexão com o tempo, (em outras palavras,) embora não seja distinto dessa Luz como um reflexo em um espelho, surge como multiforme --polimorfo-- em relação a conhecedores --sujeitos-- (e) cognoscíveis --objetos--, os quais parecem diferentes entre si. (Além disso, Abhinavagupta disse) "tato'pi ca" (ou) "e também (como diferente) inclusive Dele Mesmo" (na estrofe 13, isto é, o universo) aparece como se tivesse emergido inclusive da Consciência, porque, embora a Consciência esteja aparecendo na forma disso --na forma do universo--, estende-se como transcendental em relação a isso --ao universo--, assim como o espelho (é transcendental) em relação aos reflexos3 .

Dessa forma, a Luz que porta os reflexos (que aparecem como) os objetos do universo se estende como transcendental em relação a (esses mesmos) objetos do universo, (isto é, a Luz do Grande Senhor brilha) com a sua natureza essencial como sendo o Experimentador de tudo --a divina Realidade denominada Śiva (Você!) é Aquela que experimenta todos os objetos do universo e, portanto, Ela é sempre transcendental em relação a todos eles, pois não é "algo que deve se deve experimentar como uma coisa criada", mas sim o próprio Experimentador; este é o significado--.

Ainda que a variedade de estados (que aparece como) espaço, tempo (e) forma (e que) mora nos objetos se manifeste aqui --no universo-- somente, como (se fosse o reflexo) em um espelho, apesar disso, não entra em contato com a própria natureza --com o Espelho do próprio Ser--.

Por essa razão, sabendo que a variedade (de uma cidade, uma aldeia, etc., mencionada na estrofe 12) é admitida como (não sendo nada mais que) Consciência --como não sendo nada mais que o Espelho--, embora a Consciência seja uma (e) muitas (ao mesmo tempo, Ela é) somente uma, --em outras palavras, sabendo que tal variedade de reflexos no Espelho é apenas o Espelho chamado Consciência, como resultado, ainda que a Consciência possa parecer uma e muitas ao mesmo tempo, é realmente só uma--.

--Agora, o grande Yogarāja começa a explicar a natureza da previamente mencionada bhrānti (dúvida ou confusão) no que se refere a essa doutrina da reflexão usada para explicar a relação entre o Senhor e o universo, quando se levantou a objeção de que "um elefante realmente não está residindo em um espelho"-- No entanto, a diferença entre a Claridade da Consciência dotada de divino Deleite (e) a claridade de um espelho (comum) é de tal extensão (como será mostrado agora --isto é, a comparação tem suas limitações, que serão explicadas agora--:) O fragmento --porção-- externo que aparece como uma cidade, etc. sendo pensado como um reflexo, brilha em um espelho que apenas possui clareza, mas (esse fragmento ou porção que aparece como um reflexo) não é auto-criado. Por isso, a opinião ou assertiva de que "este (é) um elefante", (como se um elefante residisse) no espelho, tem a ver com uma confusão --é errônea no contexto de um espelho comum--. No entanto, a Luz cuja essência é o próprio Deleite (e que é) a própria Consciência, apoderando-se do universo em unidade (Consigo Mesma), sobre a Tela do Seu Ser, pelo seu próprio Livre Arbítrio, manifesta (esse mesmo) universo como (a sua) causa material4 .

A conclusão (é que:) "A capacidade de criar --Śakti ou Vimarśa, o Poder Supremo--, que pertence ao Afortunado --ao Senhor Śiva-- (e que) manifesta o universo certamente", (é) realmente "a principal característica que provoca uma diferença entre a Luz (do Senhor e) algo que seja inerte, (tal como) a claridade de um espelho, etc. " --Em suma, é a Sua Śakti ou Poder que torna Śiva diferente de um mero espelho inerte--.

Isso (também) foi expresso pelo autor (deste Paramārthasāra) --Abhinavagupta-- na sua Īśvarapratyabhijñāvivṛtivimarśinī --o seu comentário longo sobre a Īśvarapratyabhijñā de Utpaladeva--:

"O universo inteiro brilha --manifesta-se, aparece-- dentro, no Ser, aqui, assim como um multicolor arranjo (floral aparece) dentro de um espelho. No entanto, a Consciência se apodera --captura, como um espelho-- do universo por meio da Sua própria Essência (denominada) Vimarśana --Vimarśa ou Śakti--... mas o espelho não (faz) assim --como faz a Consciência--5 ."

Dessa forma, no que concerne ao Senhor Supremo, não há nenhuma confusão relativa à diferenciação ou dualidade com relação à multidão de objetos criados no Seu próprio Corpo, mas, no que concerne aos experimentadores sujeitos a Māyā, (existe) essa manifestação de dualidade que (não é nada mais que) uma confusão baseada em ignorância sobre (a própria) Plenitude. Ignorância é ausência de discriminação do que é Pleno, cuja natureza é baseada em não dualismo. (Quando isso acontece,) o que é Pleno não aparece. No entanto, (quando) o que não é Pleno, cuja essência é dualismo, aparece, (então) se percebe a diferenciação --objetos distintos entre si e distintos de mim mesmo--. Esse é o significado6 .

Portanto, essa doutrina de reflexão (é) inquestionável||13||

Pular as notas

1  Enquanto a objeção soa como "ingênua" para um especialista em Trika, parece bem séria para alguém que é leigo nesses assuntos. De qualquer forma, o compassivo Abhinavagupta compôs duas estrofes (12 e 13) para responder a essa questão elementar.

O contestador está perguntando isto: "Se o universo brilha ou existe no Mais Alto Princípio (em Śiva), como ocorre, então, a manifestação universal? Em outras palavras, se nada pode se manifestar como distinto Dele, então não deveria ter surgido nenhum universo, pois não existe nenhum movimento Nele, o Imutável. O "contestador" deixa o seu argumento claro dizendo que, por um lado, se o universo se manifesta como distinto Dele, do Senhor, então haveria a refutação da doutrina da não dualidade, pois haveria duas entidades: "o Senhor e o universo", e toda a questão não dual iria ao inferno, hehe. Por outro lado, se o universo se manifesta "em unidade" com Ele... bem, dizer isso não seria apto ou adequado. Por quê? Porque soa como contraditório dizer que algo aparece e, ao mesmo tempo, está em plena unidade com a sua Causa. Se está em plena unidade com a Causa, então não deveria aparecer a princípio, porque toda manifestação sempre implica "dualidade", que é o oposto de "não dualidade ou unidade". É isso que o contestador quis dizer por "então, como pode haver uma fala apta ou adequada?".

Obviamente, quem está levantando a objeção não tem a menor ideia sobre a relação "bhedābheda" (dualidade na não dualidade, ou dualidade na unidade, ou unidade na diversidade... escolha a forma como quiser chamá-la) entre o Senhor e o universo. Como eu disse antes, o misericordioso Abhinavagupta explicará isso em duas estrofes. Fará isso através de um exemplo extraído da vida quotidiana.Return

2  Yogarāja, o comentarista, começa a explicar as duas estrofes pouco a pouco. Primeiro, elucida e significado da frase "Darpaṇabimbe yadvannagaragrāmādi citram" do início da 12a estrofe dizendo que esse "citram" ou variedade é múltiplo. Ele até expande a descrição dada por Abhinavagupta sobre as coisas contidas nessa variedade: uma cidade, uma aldeia, uma fortaleza, etc. Deve-se notar, nessa descrição, que as palavras "nada" e "nadī" generalmente significam a mesma coisa: "um rio". No entanto, a diferença é sutil, porque "nada" é um rio de um ponto de vista masculino (sendo considerado como masculino) e "nadī" é um rio de um ponto de vista feminino (sendo considerado feminino). Como essa sutileza não pode ser incluída na tradução porque, em português, um rio é... um rio e isso é tudo, hehe, tive que usar uma tradução alternativa que também está correta. Em outras palavras, traduzi "nada" como "um rio", enquanto especifiquei que "nadī" é "uma corrente". Algo similar vale para as palavras "paśu" e "pakṣi". A primeira palavra é geralmente traduzida como "animal", mas, como a segunda palavra significa "pássaro" (que também é um animal), haveria uma contradição se a tivesse traduzido assim. Portanto, para não entrar na complexa questão sobre os cinco tipos de animais segundo as antigas escrituras (e todas essas complexidades que parecem "triviais" no presente contexto "não zoológico" porque o comentarista está simplesmente nomeando "coisas" que podem ser refletidas em um espelho límpido), optei por incluir outro significado legítimo para a palavra "paśu": Um animal doméstico, em oposição a "mṛga" (um animal selvagem). Dessa maneira, pude lidar com a aparente redundância e superá-la.

Assim, toda a múltipla variedade que consiste de todas essas coisas (uma cidade, uma aldeia, etc.), quando se reflete "realmente" em um espelho, mantém as suas características específicas. Em outras palavras, todas essas coisas das quais se compõe a variedade aparecerão no espelho como tais: Como uma cidade, como uma aldeia, como uma fortaleza, etc. Isso é óbvio, certo? Por sua vez, a variedade inteira é "avibhāgi" (da palavra bruta "avibhāgin"). Esse termo "avibhāgi" é de gênero neutro, pois qualifica "citram" (a variedade), que é um substantivo neutro. Quando se consulta um dicionário para o significado de "avibhāgin", a tradução provavelmente será "que não divide ou compartilha", porque o verbo original "vibhaj" significa "dividir, separar, etc.". Esse verbo deriva da raiz "bhaj" (dividir, distribuir, etc.), já que "vi" é simplesmente um prefixo adicionado a ele. Mas até os dicionários de sânscrito que você poderia consultar falhariam, em sua maior parte, em dar o verdadeiro significado dessa palavra "na prática", pelo menos da forma como é utilizada em Trika: "Um avibhāgin é algo ou alguém que não é diferente ou que não é separado". Escolhi o adjetivo "diferente", e não "separado", para manter a coesão da minha tradução dessas estrofes, já que o comentarista continuará falando sobre "diferenciação" e coisas similares. Sim, eu também poderia ter usado "separado", mas o resto da tradução teria tido que ser reformada também para manter a coerência e estrutura. Oh Sânscrito, você é sempre tão complicado!

E por que estou me dando ao trabalho de esclarecer tudo isso? Para leitores não eruditos? Para todos esses professores de Yoga que ensinam e ensinam Yoga todo o dia e raramente sabem do que estão falando? Para os poucos eruditos competentes em sânscrito lendo a minha obra? NÃO. É para o Senhor, o Onisciente! Tudo o que faço é sempre para Ele, o Núcleo da minha existência. É por isso que eu sou perfeccionista e utilizo o máximo da minha capacidade. Porque, embora ninguém possa notar nenhum equívoco na minha obra, Ele notará até o menor dos meus erros. Eu preferiria morrer se tivesse que ser um desses tradutores descuidados de sânscrito que estão sempre apressados para vender os seus livros cheios de traduções medíocres que conduzem as pessoas a mais e mais confusão... comportando-se como mendigos enquanto ousam traduzir a palavra emanada Dele, o Opulento. Como alguém poderia vender o que não é seu? E, além disso, não tem preço! Como alguém poderia estar preocupado sobre o seu bem-estar mundano enquanto serve o Todo-poderoso? Oh, a tolice humana. Inclusive essa variedade de tolice também se reflete no espelho do seu Coração Puro! Então, estou falando sobre esse Imaculado Espelho, o próprio Ser, que é o Coração de todos os seres. Esse Seu Coração bate tanto em sábios como em tolos porque Ele é assim: Completamente Glorioso e Transcendente!

Agora que o leitor conhece a verdadeira natureza desse Espelho Límpido chamado Śiva, o seu próprio e recôndito Ser, a sua verdadeira Identidade, ele é apto para continuar bebendo da taça de sabedoria passada a ele pelo Senhor aparecendo como Yogarāja, o discípulo principal de Kṣemarāja, que foi, por sua vez, o grande discípulo do venerável Abhinavagupta, o maior Mestre de Trika de todos os tempos. Então, toda essa variedade de coisas... manifestações surgidas a partir do Seu Poder, da Sua Śakti... olhe ao redor... todos esses objetos e sujeitos... todos eles são "avibhāgi-s" ou não distintos do próprio Espelho, que é Você. Esse é o significado. E, embora sejam assim, avibhāgi-s, isto é, embora lancem as suas formas (uma cidade, uma aldeia, um homem, uma mulher, etc.), dentro do espelho, em unidade com Ele, isto é, com o próprio Senhor, aparece repletos de diferenciação ao manter mutuamente as características específicas. Essa mulher é diferente daquele homem, esse homem é diferente daquela mulher, esse rio é diferente dessa corrente, etc. etc. Todas essas coisas que o Espelho reflete conservam as suas características e diferenças inerentes, mas, ao mesmo tempo, não podem evitar ser únicas com o próprio Espelho, com Deus!

A comparação com um espelho comum foi feita por Abhinavagupta para ensinar aos principiantes em Trika a verdadeira natureza do Seu aspecto "bhedābheda" ou "unidade na diversiddea". O universo é totalmente um com Ele, mas, ao mesmo tempo, parece distinto Dele, ou seja, mantém as próprias características. Olhe ao redor novamente... todos esses objetos e sujeitos, todos eles parecem ser distintos "entre si" (parasparam ou anyonyam, ou seja, "mutuamente"), e também parecem ser distintos de Você. No entanto, tudo isso é mera aparência, pois nenhum deles pode deixar de estar em unidade com Você, com o Senhor. Por quê? Porque todos eles se refletem no Espelho da Sua pura consciência do Eu a todo momento. Até mesmo o que você chama de "você" (o seu ego chamado João, Daniel, Joana, etc.) também é um reflexo do Espelho do seu Ser, porque o ego é um objeto, isto é, uma coisa criada e não a Mais Alta Realidade. Esse é o significado. Se você ler as estrofes e respectivos comentários sem compreender essa não dualidade entre Você e o Senhor, é cego e surdo em relação à sabedoria do Trika. Quando está tão cego e surdo, talvez possa até se tornar um erudito, mas sem nenhuma compreensão do Ser. A erudição é sempre necessária, mas, quando carece de uma compreensão, então até a erudição é infrutífera.Return

3  Depois de explicar o significado da estrofe 12, onde há uma descrição sobre uma cidade, uma aldeia, etc. refletidos em um espelho, agora, Yogarāja procede a explicar o significado da estrofe 13, onde esse exemplo com os reflexos emum espelho é utilizado para estabelecer "aproximadamente" a relação e natureza do Senhor e do universo. Disse "aproximadamente" porque existem duas diferenças principais entre um mero espelho que reflete objetos e o Senhor como um Espelho do universo: (a) Não há objetos "externos" Nele, mas sim todos eles estão "dentro" Dele próprio, (b) Enquanto um espelho comum é inerte, o Senhor é plenamente consciente, ou seja, Bem-aventurado, pois, como reza a estrofe 10: "(Ele é Alguém cuja) Grande Bem-aventurança (provém) de um descanso no próprio Ser". Em suma, o senhor é como um Espelho especial e Bem-aventurado, sem nenhum objeto refletido existindo fora Dele. Embora a comparação com um espelho comum não seja totalmente precisa, é completamente bem-sucedida de qualquer forma. Essas duas diferenças que indiquei entre um espelho comum e o Espelho conhecido como o Senhor Supremo são a essência da "confusão" mencionada previamente pelo comentarista, a qual ainda não foi explicada. Isso será feito mais adiante.

Quando comecei a traduzir o parágrafo, disse: "Agora, Yogarāja procederá a explicar a 13a estrofe, fragmento por fragmento", e ele fez isso, mas, infelizmente, não pude marcar entre vírgulas cada fragmento, ou a tradução teria ficado muito confusa. Vinte por cento do meu tempo traduzindo consiste em leitura e compreensão do sânscrito, e oitenta por cento consiste em colocar tudo isso em inglês e espanhol de modo que a tradução possa ser tão fiel em relação ao original quanto possível. Em português, inglês e espanhol, a ordem é fundamental em uma oração. Por exemplo, você pode dizer "O cachorro que mordeu o meu irmão" e fica compreensível, mas, se você falar como Yoda ou algo assim: "O cachorro pelo qual o meu irmão foi mordido", também fica compreensível, mas... mais complicado. No entanto, se você disser: "O qual o cachorro mordeu o meu irmão" ou "Pelo qual o cachorro o meu irmão foi mordido", o significado fica bem confuso. Isso não acontece em sânscrito, onde a "ordem" é secundária e "coerência de gênero/número/declinação em substantivos e coerência de conjugação verbal" são primários. Além disso, em sânscrito, existe sempre repetição da mesma declinação. Por exemplo, aquela frase "O cachorro que mordeu o meu irmão" pode ser escrita assim em sânscrito: "O qual o cachorro comeu o meu irmão" utilizando o Tempo Passado do verbo "morder", mas, em Sânscrito Clássico, o particípio passado é geralmente usado para evitar o problema chamado conjugações no Tempo Passado: "Pelo cachorro pelo qual o meu irmão mordido", e deve-se adicionar "foi" aí, pois o verbo "ser" é geralmente omitido. Mas, como a ordem é secundária em sânscrito, você também poderia escrever: "Pelo qual mordido o meu irmão pelo cachorro". Note como há repetição de "pelo... pelo". Isso é muito comum em sânscrito e essa escritura não é nenhuma exceção.

Como as estruturas do sânscrito e do português são tão diferentes entre si, tive que comprometer algumas coisas a cada passo. Nesse último parágrafo escrito pelo comentarista, pude marcar as seguintes palavras e frases que aparecem nas estrofes: "Tadvat", "jagat" e "tato'pi ca". E pude, também, adicionar os respectivos significados sem quebrar a estrutura na tradução. De qualquer forma, houve outras coisas que não pude marcar tão facilmente, porque, se tivesse feito isso, as traduções teriam ficado muito confusas: "Vimalatamaparamabhairavabodhāt", "vibhāgaśūnyamapi" e "ābhāti". Essas três expressões ocorrem na estrofe 13, mas não pude dizer: "Vimalatamaparamabhairavabodhāt (significa)...", como você sabe, mas tive que escrever tudo de maneira corrida para não quebrar a estrutura das orações em espanhol. Assun, utilizarei esta nota para explicar o significado dessas expressões de maneira mais clara. Vamos começar:

— "Vimalatamaparamabhairavabodhāt" significa literalmente "da Consciência do extremamente Puro Paramabhairava --o Supremo Bhairava ou Śiva--", e Yogarāja explica isso como "Daquele que é a Luz abundante em Bem-aventurança Perfeita e que está proeminentemente desprovido de toda conexão com o tempo".

— "Vibhāgaśūnyamapi" significa literalmente "embora não seja diferente", e Yogarāja explica isso como "embora não seja distinto dessa Luz como um reflexo no espelho".

— "Ābhāti" significa literalmente "aparece" (ou seja, o universo aparece), mas Yogarāja não dá nenhuma explicação adicional sobre isso.**

E, com relação à expressão "anyonyam ca" que ocorre na estrofe 13, como o seu significado é muito claro, Yogarāja simplesmente escreveu um sinônimo: "parasparam ca" (entre si). Em suma, anyonyam e parasparam significam a mesma coisa: "mutuamente".

Agora, no que se refere ao significado do parágrafo inteiro, como eu disse no princípio desta nota, Yogarāja começa a explicar o exemplo de um espelho e seus reflexos, dado por Abhinavagupta, mas agora no caso do Senhor e do universo. Ele diz que o universo, assim como um reflexo no espelho, embora não seja diferente da Consciência do Senhor Supremo (o Espelho), surge como multiforme ou polimorfo, isto é, como repleto de múltiplos sujeitos e objetos. Dessa forma, o fato de que o Senhor é "Um" enquanto o universo é "múltiplo" é corretamente explicado às pessoas que ainda devem ser instruídas (lembre que Abhinavagupta escreveu essa escritura para aspirantes que ainda não são plenamente versados em Trika). Esses sujeitos e objetos dos quais se compõe o universo parecem distintos entre si e também do próprio Espelho (o Santo Senhor). O universo parece diferente inclusive do próprio Senhor, porque Ele sempre é transcendental em relação ao universo. Embora o universo resida Nele, Ele está além dele a todo momento, assim como um espelho é sempre transcendental em relação aos reflexos na sua superfície.

Como é possível compreender o Seu Estado Transcendental no caso de alguém que ainda é um principiante em espiritualidade? Desta forma: Imagine uma "pena" sendo refletida em um espelho. Em seguida, imagine que um "elefante" está sendo refletido no mesmo "espelho". Quando o espelho estava mostrando a pena, nunca se tornou leve como a pena. Da mesma forma, quando mostrou o reflexo do elefante, não ficou pesado como um elefante. NÃO. O espelho sempre permanece "além" do objeto que se reflete nele. Da mesma forma, não importando se se reflete "uma formiga" ou "uma galáxia" no Espelho chamado o Grande Śiva, é a mesma coisa para Ele. Por quê? Porque Ele é Transcendental em relação a tudo o que é manifestado pela Sua Luz sobre a imaculada superfície do Seu Ser. Não se torna pequeno como uma formiga ou grande como uma galáxia, mas sim permanece Imutável. Oh Senhor Śiva, Você é tão Grande!

É por isso que Ele é a Mais Alta Realidade, enquanto o resto de sujeitos e objetos, embora estejam em plena unidade com Ele, permanecem como meras realidades sujeitas a mutação. Eu mesmo explico isso na primeira nota como relação "bhedābheda" (dualidade na não dualidade - dualidade na unidade - unidade na diversidade, as três definições significam o mesmo). Por meio dessa relação "bhedābheda", unidade e dualidade entre o Senhor e o universo são explicados de maneira racional a uma mente que ainda não está espiritualmente madura. À medida que um aspirante avança mais e mais, descobrirá que a Verdade é sempre "abheda" ou não dual porque nunca houve nenhum movimento no Senhor, ou seja, não houve nenhuma manifestação universal... mas essa é outra história que não explicarei agora para não te confundir ao extremo.

E, quando você tem uma verdadeira experiência com o Espelho do seu próprio Ser, não sabe "quando" ou "onde" essa experiência ocorreu, porque Ele está além de espaço e tempo. Você pode saber que teve essa experiência "hoje", mas não sabe o exato momento ou o lugar onde a teve. Isso é assim porque o Ser, como um Espelho, sempre transcende todos os objetos deste universo, que são como os Seus reflexos. Por "objetos" quero dizer não somente "coisas" que se veem ao redor, mas também "mente, ego, intelecto, tempo, espaço, etc.", isto é, todas as realidades que foram manifestadas pelo Seu Poder ou Śakti. Oh, Śiva é tão Grande! Por essa razão, o sábio Vasugupta misteriosamente disse nos seus Spandakārikā-s I.13:

... न त्वेवं स्मर्यमाणत्वं तत्तत्त्वं प्रतिपद्यते॥१३॥
... Na tvevaṁ smaryamāṇatvaṁ tattattvaṁ pratipadyate||13||

... Entretanto, esse princípio (do Spanda) não é percebido ou captado desse modo, (ou seja), como um estado ou lembrança||13||

Por "princípio do Spanda", indica-se a verdadeira natureza do Grande Senhor, obviamente. Essa Sua natureza nunca pode ser lembrada, porque está além da estrutura espaço-temporal. A doutrina que explica a relação entre o Supremo Bhairava (Śiva) e o universo utilizando um espelho e os seus reflexos é conhecida como: "Pratibimbavāda" ou "A doutrina da reflexão". Às vezes, também é denominada: "Bimbapratibimbavāda" ou "A doutrina do objeto e seu reflexo". Muito bem, é o bastante!Return

4  As coisas são muito simples apesar do "eternamente complicado sânscrito". Escute com atenção: Em um parágrafo anterior, levantou-se a objeção "um elefante não reside realmente em um espelho" para refutar o exemplo dado por Abhinavagupta. Essa objeção foi aceita por Yogarāja, já que, depois de tudo, o exemplo que utiliza o espelho é "um exemplo", e não a Mais Alta Realidade, ou seja, nada que possa ser formulado em palavras, pensamentos, etc. pode ser uma representação "exata" do Grande Senhor e Sua relação com o universo. Além disso, disse que essa objeção foi levantda devido a uma dúvida ou confusão. Agora, por meio do atual parágrafo, ele está explicando a natureza de tal dúvida ou confusão. Também já falei sobre essa confusão na nota explicativa que precede esta.

Yogarāja disse, no início, que "a diferença entre a Claridade da Consciência dotada de divino Deleite (e) a claridade de um espelho (comum) é de tal extensão" no sentido de que ia mostrar "a extensão das diferenças entre um espelho comum e o Espelho conhecido como o Grande Senhor", isto é, ia mostrar exatamente as diferenças entre o exemplo dado por Abhinavagupta e a Mais Alta Realidade propriamente dita. Uma das diferenças entre ambos já é insinuada quando o comentarista diz que a Mais Alta Realidade está cheia de divino Deleite e Claridade (Luz), isto é, repleta de Śakti e Śiva, respectivamente, enquanto o espelho comum não é descrito como dotado dessas duas qualidades, porque é um objeto inerte. Esse é o significado dessa aparentemente complexa frase.

Depois, Yogarāja expande a sua explicação da diferença exata entre o mero exemplo que utiliza um espelho junto de objetos externos e o próprio Senhor e seu universo. Ele diz que "o fragmento --porção-- externo que aparece como uma cidade, etc. sendo pensado como um reflexo, brilha em um espelho que meramente possui claridade, mas (esse fragmento ou porção que aparece como um reflexo) não é auto-criado". Essa é a principal diferença entre ambos, entre um espelho comum/objetos externos e o Senhor em conjunção com o universo. Em um espelho, é sempre somente "um fragmento ou porção" que é refletido. Nenhum espelho comum pode refletir a "totalidade do universo". É por isso que o grande sábio utilizou a palavra "bhinnam" (fragmento ou porção) para especificar isso. Em seguida, ele estabelece claramente que essa porção deve ser pensada como um reflexo, e NÃO como os objetos propriamente ditos (uma cidade, uma aldeia, etc.). Dessa forma, a confusão sobre um elefante que reside dentro de um espelho é apenas um mero mal-entendido, porque, entre um espelho comum e os objetos externos, existe uma relação baseada no reflexo desses objetos sobre a sua superfície. De qualquer forma, o mesmo não é verdadeiro no caso de Śiva por duas razões: (1) o Senhor contém o universo inteiro dentro de Si Mesmo, e não somente um fragmento, (2) Nenhum objeto é refletido Nele "a partir de fora", mas sim o objeto reside dentro Dele Mesmo, já que o Seu Poder o cria. Em suma, não existem "objetos externos" no Seu caso. No entanto, no caso de um espelho comum, os objetos não residem dentro dele, e sim apenas os seus reflexos... é por isso que Yogarāja expressou "mas (esse fragmento ou porção que aparece como um reflexo) não é auto-criado", isto é, o espelho não pode criar objetos e depois refleti-los. NÃO, não pode. Apenas reflete objetos que já foram criados por "outro agente". E esses objetos não estão dentro dele, apenas os seus reflexos.

Portanto, a objeção sobre "um elefante residindo em um espelho" é refutada, porque é apenas válida no caso de um espelho comum, e não no caso do Espelho conhecido como o Senhor Supremo. Enquanto é verdade que nenhum elefante mora dentro de um espelho, apenas o seu reflexo, o mesmo não é verdadeiro no Seu caso, pois Ele é capaz de criar objetos, mantê-los no Seu Ser e também refleti-los como um Espelho divino. Dessa forma, as limitações entre o exemplo dado por Abhinavagupta e a Mais Alta Realidade são notáveis.

O comentarista torna muito clara essa notável diferença quando diz: "No entanto, a Luz cuja essência é o próprio Deleite (e que é) a própria Consciência, apoderando-se do universo em unidade (com Ela Mesma), sobre a Tela do Seu Ser, pelo Seu Livre Arbítrio, manifesta (esse mesmo) universo como (sua) causa material".

Um espelho comum não é nem a causa material dos objetos que se refletem nele, nem está apoderando-se dos mesmos em unidade com ele mesmo (está apenas se apoderando dos seus reflexos dessa maneira, mas não dos objetos propriamente ditos). E o espelho não está fazendo isso pelo seu livre arbítrio, mas sim é forçado a fazer isso, pois os objetos estão ali para que ele mostre os seus reflexos. Finalmente, como é óbvio, um espelho comum, por ser um objeto inerte, carece sempre de Deleite como no caso da Consciência (Você!).

Ainda assim, apesar de todas essas limitações inevitáveis, o exemplo expresso por Abhinavagupta nas estrofes 12 e 13 é muito útil para que as pessoas tenham um vislumbre da relação entre o Senhor e o universo, isto é, elas podem começar a compreender essa misteriosa questão através de um exemplo bem simples.Return

5  Resumindo: A principal diferença entre um espelho comum e a Consciência (o Senhor Supremo) é que o primeiro carece de qualquer capacidade para criar ou manifestar, enquanto a segunda está repleta de tal capacidade. Essa capacidade de criar ou manifestar é conhecida como Śakti, Vimarśa, Vimarśana, etc. Em suma, é o Poder de Śiva, por meio do qual Ele manifesta o universo inteiro dentro de Si. É mencionado no comentário como Luz, Consciência, etc., mas todas essas palavras significam a mesma coisa: O Supremo Śiva. Para apoiar a sua declaração, o comentarista cita uma passagem da Īśvarapratyabhijñāvivṛtivimarśinī composta pelo próprio Abhinavagupta. Īśvarapratyabhijñāvivṛtivimarśinī é o comentário longo (porque existe um comentário curto intitulado simplesmente "Īśvarapratyabhijñāvimarśinī") sobre a suprema obra escrita pelo Guru do seu Guru (o sábio Utpaladeva, que escreveu a principal escritura da escola Pratyabhijñā de Trika: "Īśvarapratyabhijñā").

Nessa passagem, Abhinavagupta estabelece que, embora a analogia entre o espelho e o Senhor seja muito boa para ensinar a relação entre Ele e o universo, não está livre de limitações inerentes. Abhinavagupta indica que a principal diferença entre um espelho comum e a Consciência (o Senhor) é que, enquanto a segunda captura o universo (como se Ela fosse um espelho divino) por meio do Seu Poder (Vimarśana, Vimarśa, Śakti, etc.), o primeiro não faz isso, já que é um objeto inerte desprovido de Poder Supremo. As palavras Vimarśana ou Vimarśa indicam "consciência", ou seja, que, por meio do Seu Poder Supremo, o Senhor é plenamente consciente do universo refletido em Si Mesmo. Entretanto, o espelho não é consciente dos objetos que se refletem nele devido à ausência de Vimarśana ou Vimarśa no mesmo. Muito bem, está bem claro agora, não é?Return

6  Para entender esse último parágrafo, o leitor deve reler as estrofes:

"Assim como a variedade (composta de) uma cidade, uma aldeia, etc. quando refletida em um espelho, (embora) não seja diferente (do espelho), aparece como mutuamente diferenciada --como uma cidade, uma aldeia, etc.-- e também (como diferente) inclusive do (próprio) espelho, da mesma forma, este universo, ainda que não seja diferente da Consciência do extremamente Puro Paramabhairava --o Supremo Bhairava ou Śiva--, aparece como mutuamente diferenciado e também (como diferente) inclusive Dele Mesmo".

Essas duas estrofes (12 e 13) estão falando sobre a experiência de um indivíduo limitado, obviamente, e não sobre a experiência do Senhor. Ambos têm a ver com os indivíduos limitados (chamados "os experimentadores sujeitos a Māyā" pelo comentarista) que estão sob o domínio dessa dualidade, e não com o Ser Supremo. O Grande Senhor Śiva, como um Espelho divino, reflete o universo inteiro dentro de Si Mesmo, no Seu próprio Corpo. Ao mesmo tempo, é o Seu Poder (Śakti) que manifestou todo esse universo para Ele. Portanto, não há nenhuma dualidade no Seu caso, isto é, Ele não vê objetos que sejam "diferentes entre si", ou inclusive "diferentes de Si Mesmo". A Sua Śakti ou Poder também é Vimarśa ou Consciência, o que Lhe permite ser plenamente consciente de todos os objetos ao mesmo tempo, em total unidade com todos eles. Essa é a Experiência divina.

Agora, do ponto de vista de um miserável "experimentador sujeito a Māyā" (um māyāpramātā), os objetos deste universo parecem "mutuamente diferentes", e também "diferentes dele mesmo". Eu poderia dizer muitas "coisas eruditas" sobre o que é um māyāpramātā, por exemplo, que é uma categoria de experimentadores que consistem em duas classes denominadas "pralayākala" e "sakala", mas não quero falar dessas complexidades aqui. Por enquanto, é suficiente que você saiba que um māyāpramātā é alguém que está "convencido" de que não é Śiva, mas sim um "indivíduo". Alguém que "alcançou" tal estúpida condição é adequadamente conhecido como "māyāpramātā". Está sujeito a Māyā (não à Māyāśakti, mas sim ao Māyātattva nesse contexto, a sexta categoria do processo de manifestação universal... Abhinavagupta, Yogarāja e eu falaremos sobre a diferença entre Māyāśakti e Māyātattva mais adiante... então, não se preocupe com isso agora). Māyātattva é a morada do Māyīyamala (a impureza máyica), o qual gera diferenças. Dessa forma, todos esses indivíduos limitados sujeitos ao poder do Māyīyamala estão "convencidos" de que os objetos criados e refletidos em Śiva (o seu recôndito Ser) são diferentes entre si e inclusive diferentes do próprio Śiva. Isso é denominado "manifestação de dualidade" por Yogarāja nesse último parágrafo, e ocorre devido ao trabalho do Māyīyamala. Mas de onde veio o Māyīyamala? Veio do Māyātattva, obviamente, e o Māyātattva foi produzido devido à presença do Āṇavamala, a impureza que pertence a um indivíduo limitado ou aṇu.

Eu também poderia dizer muitas coisas eruditas sobre Āṇavamala, mas, por enquanto, saiba isso: Āṇavamala te faz sentir que "não é Perfeito/Pleno". Essa falta de Plenitude é a raiz da individualidade. Todos os indivíduos estão experimentando-a neste exato momento. Esse Āṇavamala é sempre denominado "a impureza primordial". Ignorância sobre o quê? O comentarista está estabelecendo-o claramente nesse último parágrafo: "ignorância sobre (a própria) Plenitude". Assim, toda essa confusão chamada "manifestação de dualidade", que está repleta de diferenças (o objeto A é diferente do objeto B, amo essa pessoa mas não aquela, esse emprego é melhor do que aquele, gosto mais disso, isso é nascimento e aquilo é morte, isso é dor e aquilo é prazer, etc.), é totalmente baseada no Āṇavamala, na própria ignorância sobre a sua Plenitude. Por que os indivíduos limitados estão correndo atrás desse ou daquele objeto? Porque pensam que alcançarão "Plenitude" se puderem obter tudo isso. Não terão sucesso, obviamente, porque isso é ilusão. A Plenitude é a Possessão do Senhor apenas, e Ele a dá a um indivíduo quando assim desejar. Esse é o Seu célebre ato de concessão de Graça a um indivíduo sujeito a Māyā.

Quando existe "disseminação" do que é Pleno, ou seja, total compreensão (dar-se conta) de Śiva, não há nenhuma ignorância. E, como não há nenhuma ignorância, não há nenhuma dualidade como resultado. A Mais Alta Realidade (Śiva, o Pleno) está completamente baseado em "não dualismo" (Ele é sempre Um). De qualquer forma, quando existe ausência de "disseminação" do que é Pleno, quando não existe nenhuma compreensão de Śiva no indivíduo, o dualismo surge como uma consequência natural. A dualidade é a própria essência do que não é Pleno (o produto do Āṇavamala, a impureza primordial). Quando o Grande Senhor diz: "Agora, não quero ser Pleno", o Seu Poder converte a Ele, o Glorioso, em um miserável indivíduo limitado ligado a coisas, outras pessoas, etc. Toda essa miséria ocorre porque Ele perdeu a Sua Plenitude "voluntariamente" e tornou-se um ser individual que está sempre com problemas (a propósito, você conhece algum?). Em suma, a dualidade é percebida apenas pelos indivíduos, porque estão sujeitos a Māyā (e ao seu ominoso Māyīyamala). Mas, por sua vez, Māyā e Māyīyamala surgiram a partir do Āṇavamala, a impureza primordial baseada em "ausência de Plenitude". Portanto, o Āṇavamala ou o Seu ato de perder a Plenitude quando desejar é a causa raiz da percepção de dualidade ao redor e dentro de si mesmo. Na experiência do Grande Senhor, como não está sendo perturbado por nenhum Āṇavamala, a dualidade não pode existir de forma alguma.

Em consequência, apesar das inerentes limitações, a doutrina da reflexão (pratibimbavāda) não pode ser refutada no que se refere a explicar a relação entre o Śiva Supremo (Você!) e o universo manifestado pela Sua Śakti ou Poder. Por meio dessa doutrina simples, um indivíduo limitado pode começar a compreender, de modo adequado, a Mais Alta Realidade e o universo!Return

Ao início


 Estrofe 14

Dessa forma, tendo estabelecido o estado do universo —que consiste em trinta e seis categorias— em unidade com (a Sua) Luz —estando o (seu estudo) acompanhado de uma investigação sobre a natureza essencial do Mais Alto Princípio—, (Abhinavagupta) também explica, por meio de (um determinado número de) aforismos, a natureza de cada categoria desse (universo) segundo a ordem de manifestação1 .


Através de uma divisão dos (Seus) cinco Poderes, (Paramaśiva) manifesta o estado táttvico composto (pelos tattva-s ou categorias denominados) Śiva, Śakti (e) Sadāśiva em conjunto com Īśvara (e) Sadvidyā||14||


A natureza essencial (de Paramaśiva --o Śiva Supremo-- já) foi explicada logo antes (desta estrofe) enquanto se investigava o Mais Alto Princípio. Os cinco Poderes chamados Cit --Consciência--, Nirvṛti --Bem-aventurança--, Icchā --Vontade--, Jñāna --Conhecimento-- (e) Kriyā --Ação-- —os quais formam a Sua natureza essencial—, são a causa de um grupo de infinitos poderes. Por meio de uma divisão —que, (paradoxalmente,) não envolve uma separação Dele— desses cinco poderes, esse mesmo Paramaśiva "bhāsayati", (ou seja,) manifesta, com suas características específicas, esse estado táttvico particularizado pelo número cinco --Ele manifesta os primeiros cinco tattva-s ou categorias da manifestação universal designando um dos Seus cinco Poderes a cada um deles--. Esse é o significado2 .

"A que se assemelha?" --Com o que se parece o estado táttvico manifestado por Paramaśiva?--. (Abhinavagupta) disse "Śiva, etc." --em suma, o estado táttvico mencionado por Abhinavagupta consiste nos seguintes cinco tattva-s ou categorias: Śiva, Śakti, Sadāśiva, Īśvara e Sadvidyā (também conhecida como Śuddhavidyā)--.

(O termo) "tām" (em "Śivaśaktisadāśivatām"), expresso dessa maneira, (implica o caso Acusativo de "tadbhāvā" ou) aquilo cujo estado ou condição lhes pertence. (A quem? A) Śiva, Śakti e Sadāśiva. Similarmente, (o termo "īśvaravidyā-mayīm" implica o caso Acusativo de "īśvaravidyāprakṛtiḥ" ou) aquilo no qual a natureza é Īśvara e Sadvidyā, sim!3 .

Aqui, ensina-se a natureza essencial de cada tattva: Dessa forma, (em primeiro lugar, tem-se) Caitanya ou Consciência, cuja essência é uma Grande Luz que transcende todos os tattva-s ou categorias (e) está repleta do Deleite da Perfeita consciência do Eu, (que reside) dentro de todos os experimentadores. Esse (é) o tattva ou categoria (conhecido como) Śiva.

Nesse contexto, "a investigação dos tattva-s ou categorias (será levada a cabo) em relação a uma pessoa que deve ser instruída" --em outras palavras, será levada a cabo em relação a uma pessoa que ainda não está instruída sobre esses mistérios--.

O estado de Śakti --o segundo tattva-- (é) esse Ānanda ou Bem-aventurança desse Afortunado cuja forma é Cit ou Consciência (e) que sente "Eu me torno o universo". (Ela --Śakti--) é a essência do estado universal, (Ela é) Saṁvid ou Consciência Pura, cuja forma (assume) uma leve expansão, (já que, nessa etapa, Ela é) o estado Semente de todas as entidades --objetos e sujeitos desse universo--4 .

Essa mesma (Śakti), ao dar início (à tarefa de) manifestar (e) dissolver o universo, tem inclusive a Sua forma tanto cheia (quanto) vazia --lit. emaciada--. (Por causa disso, Ela) é chamada Ekā ou Única em todas as doutrinas secretas.

Por outro lado, nesse estado Semente da manifestação universal, (também) denominado o Vazio, que está além do grande vazio, esse mesmo estado de Sadāśiva --o terceiro tattva ou categoria-- (é) um Deleite que está repleto da Perfeita consciência do Eu do Grande Senhor (e que assume a forma de) "Eu (sou) Isto" --isto é, "Eu sou o universo"--, com completa unidade (entre "Eu" e "Isto"). (A categoria ou tattva chamada Sadāśiva ocorre) porque existe um repouso na consciência do Eu por parte da porção Kriyā --Kriyāśakti ou Poder de Ação-- devido ao predomínio de Jñāna --Jñānaśakti ou Poder de Conhecimento--.

Os experimentadores ou conhecedores (chamados) Mantramaheśvara-s ou os grandes senhores do Mantra --"Aham" ou "Eu"-- moram aqui --em Sadāśivatattva--5 .

Da mesma forma, aqui mesmo --no estado Semente da manifestação universal--, esse mesmo estado Seu --do Senhor-- (denominado) Īśvara (é) um Deleite em Seu próprio Ser, que (assume a forma de) "Eu (sou) Isto " --"Eu sou o universo"--, com completa unidade (entre "Eu" e "Isto"), onde "Eu" e "Isto" (permanecem) ao estilo de (dois) pratos mantidos em equilíbrio --lit. igualados em peso-- em uma balança.

Os experimentadores ou conhecedores (chamados) Mantreśvara-s ou os senhores do Mantra --"Aham" ou "Eu"-- (residem) aqui.

Inclusive nisso --no estado Semente da manifestação universal--, esse mesmo tattva ou categoria do Afortunado --do Senhor-- (é conhecido como) Śuddhavidyā --ou Sadvidyā--, visto que é da essência do Conhecimento. (É) um Deleite que assume esta forma: "Eu (sou) Eu (e) Isto (é) Isto", devido ao predomínio do lado "Isto" --o universo--, que torna o lado "Eu" secundário. (Esse tipo de Deleite) é indicado como se o bebê (cujo nome é) Sadyojāta (apontasse o) dedo para (a própria) cabeça --como um bebê que está totalmente fascinado por um objeto à sua frente--6 .

Setenta milhões --7 crores ou krores-- de mantra-s como indicadores ou designadores junto com (os oito) Vidyeśvara-s existem certamente aqui --em Śuddhavidyātattva, a quinta categoria-- para elevar os indivíduos limitados --lit. os animais-- —os quais são indicados ou designados— até (o nível dos) Mantramaheśvara-s e Mantreśvara-s --grandes senhores do Mantra e senhores do Mantra, respectivamente-- através da natureza essencial da Graça divina (de Śiva)7 .

Embora não haja diferença no que concerne à forma ou natureza do Conhecimento no caso dos experimentadores ou conhecedores (chamados) Vidyeśvara-s, (que residem) nesse Śuddhavidyātattva, existe (uma certa) disseminação de diferença --dualidade-- que foi manufaturada pela (Sua) Māyāśakti --Seu poder para manifestar diferença ou dualidade--. Estabelece-se assim nos Āgama-s ou escrituras reveladas --nos 64 Bhairavatantra-s--:

"Mahāmāyā --a grande Māyā-- (está) acima do Māyātattva --o sexto tattva ou categoria da manifestação universal--..."

Como resultado, diz-se que os Mantra-s --os experimentadores ou conhecedores pertencentes ao quinto tattva-- que moram ali --na Mahāmāyā, ou, "estritamente falando", na Parāmahāmāyā, a porção superior da Mahāmāyā-- (se tornam) "átomos" --indivíduos com certa limitação nesse nível-- devido à (sua) entrada na Mahāmāyā.

Os experimentadores ou conhecedores (denominados) Vijñānākala-s, que (residem) em cima do Māyātattva --a sexta categoria-- e embaixo do Śuddhavidyātattva --a quinta categoria--, (são) um recipiente do Āṇavamala8 .

Dessa forma, embora essa única natureza essencial de Śiva esteja além de Turya --o Quarto Estado--, diz-se que está dotada de um grupo de cinco tattva-s ou categorias cuja essência é Turya9 .

Em consequência, esse único (Paramaśiva) manifesta-se como o Livre Kartā --Agente ou Fazedor--. (Depois disso), a Sua Luz que (reside) nos estados de Sadāśiva (e) Īśvara como "Eu (sou) Isto" (torna-se) esse Karaṇa --Causa ou Instrumento de ação-- cuja essência (é) Conhecimento Puro. E a emissão de tattva-s ou categorias —que será discutida mais adiante— que começa com o Māyātattva --a sexta categoria-- (e) termina em Dharā --terra, a última categoria, ou seja, a 36a-- (é) kārya --o efeito--. Assim, o único Experimentador ou Conhecedor Supremo chamado o Grande Senhor —o próprio Ser— aparece na forma de Agente ou Fazedor, Causa ou Instrumento de ação (e) atividade (ou efeito)10 ||14||

Pular as notas

1  Abhinavagupta já explicou a natureza do Mais Alto Princípio (o Ser Supremo). Além disso, também estebeleceu o estado do universo, que consiste em 36 categorias (tattva-s) em unidade com a Sua Luz, isto é, estabeleceu que existe total não dualismo, do ponto de vista do Senhor em relação ao universo. De qualquer forma, do ponto de vista de um indivíduo limitado, o dualismo parece ser predominante. Essa não dualidade na diversidade e o restante foram explicados por ele detalhadamente por meio de estrofes anteriores. Agora, Abhinavagupta discutirá aprofundadamente o tema chamado "tattva-s" ou "categorias da manifestação universal", descrevendo cada categoria de acordo com a sua ordem no processo de manifestação a partir do próprio Senhor. Fará isso através de um determinado número de aforismos que começam com o atual. Deve-se notar que haverá algumas "diferenças" sutis, que marcarei, entre o que é ensinado por Yogarāja e o que é ensinado pela principal escritura do Trika que versa sobre tattva-s (Ṣaṭtriṁśattattvasandoha). Nada terrível, mas principiantes em Trika poderiam ficar confusos se não explicasse essas diferenças e as razões por trás das mesmas. Você foi avisado então. De qualquer forma, não se preocupe com isso, pois estou no controle de tudo isto, como sempre. Sem a ajuda do Guru, quase nenhum discípulo (exceto aqueles muito raros discípulos que podem conseguir libertação final por conta própria, sem a ajuda de nenhum Guru) pode ir a lugar algum em espiritualidade, pois as escrituras costumam ser muito sutis ou, inclusive, extremamente contraditórias sobre muitos temas. A função de um Guru é dissipar todas as dúvidas por meio da lua do seu conhecimento. Muito bem, é suficiente por enquanto!Return

2  O comentarista estabelece, no início, que a natureza do Senhor Supremo (Paramaśiva) já foi explicada nas estrofes anteriores, enquanto Abhinavagupta e ele estavam investigando o Mais Alto Princípio. Em seguida, ele nomeia os cinco principais poderes do Senhor: Cit, Nirvṛti, Icchā, Jñāna e Kriyā (Consciência, Bem-aventurança, Vontade, Conhecimento e Ação, respectivamente). Deve-se notar que ele utilizou a palavra "Nirvṛti" em vez da conhecida "Ānanda" (Bem-aventurança). Já que ambos os termos (Nirvṛti e Ānanda) são sinônimos, ele está falando sobre o mesmo "Poder de Bem-aventurança" pertencente ao Mais Alto Princípio. Em adição, Yogarāja, o comentarista, diz que esses Seus cinco Poderes formam a Sua natureza essencial, ou seja, são o Núcleo do Grande Senhor. Por sua vez, esses Seus cinco Poderes são a fonte de infinitos poderes que aparecem como todo o universo que pode ser percebido neste exato momento.

Como Paramaśiva manifesta (bhāsayati ou prakaṭayati) esse primeiro estado táttvico, isto é, o estado particularizado ou distinguido por 5 tattva-s ou categorias conhecidas como Śiva (tattva 1), Śakti (tattva 2), Sadāśiva (tattva 3), Īśvara (tattva 4) e Sadvidyā --também denominado Śuddhavidyā-- (tattva 5)? (Note que Abhinavagupta designou a categoria Sadvidyā ou Śuddhavidyā como "Vidyā" para satisfazer os requisitos da métrica... estou usando o nome inteiro dessa quinta categoria para não produzir confusão na mente do leitor, já que o oitavo tattva leva o nome "Vidyā" também... muito bem, não se preocupe com isso agora). O Senhor manifesta esse primeiro estado táttvico por meio de uma divisão, sem que essa divisão tenha necessariamente que envolver um "estado de separação Dele" (ou seja, Ele divide, mas conserva, a inerente unidade Consigo Mesmo sempre). Ele faz isso mantendo cada um desses primeiros cinco tattva-s ou categorias com as suas próprias características --p. ex.: o Seu Poder de Consciência (Cit) é atribuído exclusivamente à categoria Śiva, e assim sucessivamente com o resto dos tattva-s--. É muito simples de entender, não é? Leia, como sempre, a famosa Tabela de Tattva-s e todas as páginas que versam sobre Trika (panorama): Trika 1, Trika 2, Trika 3, Trika 4, Trika 5 e Trika 6 para ter um conhecimento básico sobre tattva-s ou categorias. Isso provará ser útil para compreender tudo o que Abhinavagupta e Yogarāja dirão posteriormente. Sim, explicarei tudo em detalhes como sempre, mas o conhecimento adicional é sempre de grande ajuda.Return

3  De forma "aterradora", o comentarista explica o significado dos termos "tām" e "mayīm" em "Śivaśaktisadāśiva-tām" e "īśvaravidyā-mayīṁ" (veja a estrofe, por favor). O "ṁ" final em "mayīṁ" é originalmente "m" (mudou para "ṁ" pela 10a Regra do Sandhi de Consoantes). Assim, a palavra verdadeira é "mayīm". Por suz vez, esses termos "tām" e "mayīm" são o caso Acusativo de "tā" e "mayī" (ambos de gênero feminino). O caso Acusativo tem a ver com o objeto direto em uma oração. Efetivamente, tanto "Śivaśaktisadāśiva-tām" quanto "īśvaravidyā-mayīm" constituem o objeto direto do verbo "bhāsayati" ou "(Paramaśiva) manifesta". De qualquer forma, existe outra expressão declinada no caso Acusativo (como objeto direto) também: "tattva-daśām" ou "o estado táttvico". Esse é o principal objeto direto afetado pelo verbo "bhāsayati", enquanto "Śivaśaktisadāśiva-tām" e "īśvaravidyā-mayīm" também estão declinados no caso Acusativo para denotar que ambos se relacionam com "tattva-daśām". Isso é muito comum em sânscrito, mas não em português. Por exemplo, se traduzisse "Śivaśaktisadāśivatāmīśvaravidyāmayīṁ ca tattvadaśām... bhāsayati" de forma literal, ficaria assim:

"(Paramaśiva) manifesta (bhāsayati) o estado táttvico (tattva-daśām), (isto é,) aquele cujo estado ou condição (tām) (são os tattva-s ou categorias denominados) Śiva (śiva), Śakti (śakti) (e) Sadāśiva (sadāśiva), e também (ca) o que consiste em (mayīm) Īśvara (īśvara) (e) Sadvidyā (vidyā)".

Isso é bastante ilegível e fica feio, certo? É por isso que, por conveniência, tive que simplificar a tradução enquanto, ao mesmo tempo, lutava para ser fiel ao texto original:

"(Paramaśiva) manifesta (bhāsayati) o estado táttvico (tattva-daśām) composto (tām... mayīm) (pelos tattva-s ou categorias denominados) Śiva (śiva), Śakti (śakti) (e) Sadāśiva (sadāśiva) em conjunto com (ca) Īśvara (īśvara) (e) Sadvidyā (vidyā)".

Agora, o texto está muito mais legível, não está? E esses termos "tā" e "mayī" são utilizados desta forma: Cada vez que agrego "tā" a uma palavra, o sentido de "estado de" também é agregado automaticamente. Por exemplo: "bhinna" (dividido) + tā = bhinnatā (o estado de estar dividido = divisão). Esse afixo "tā" (de gênero feminino) é sinônimo do afixo "tvam" (de gênero neutro) e ambos formam os conhecidos substantivos "abstratos", p. ex.: bhinnatā = bhinnatvam = divisão. Isso é bem simples de entender, não é? Portanto, a frase: "Śivaśaktisadāśivatā" (caso Nominativo) significa "o estado de Śiva, Śakti e Sadāśiva" e "Śivaśaktisadāśivatām" (caso Acusativo) significa "o estado de Śiva, Śakti e Sadāśiva" (mas como objeto direto do verbo). No entanto, visto que traduzi "tattva-daśām" como "o estado táttvico", mão podia ser redundante com a palavra "estado". Por sua vez, "mayī" é a forma feminina do substantivo "maya", que significa: "que consiste em", "composto de", "repleto de", etc. Abhinavagupta escreveu o substantivo no feminino porque está relacionado a "daśā" ("estado", que é de gênero feminino em sânscrito).

Muito bem! Agora, o comentarista revela o significado dessas duas palavras "tā" e "mayī" por meio de um Vyadhikaraṇabahuvrīhi e um Samānādhikaraṇabahuvrīhi (Compostos Atributivos cujos membros aparecem declinados em casos diferentes e no mesmo caso, respectivamente, quando se "dissolve" o composto), sendo o primeiro composto Genitivo e o segundo, Locativo (leia aquela página que dá uma introdução a esse tipo de composto, por favor). Sim, é muito complicado, eu sei, mas o sânscrito é assim tão divertido com muita frequência, hehe. Yogarāja explica "tā" como o Vyadhikaraṇabahuvrīhi (Genitivo) "tadbhāvā" (a forma feminina de "tadbhāva" - lit. "o tornar-se isso"). Como resultado, "tā" significaria "o tornar-se isso" (no gênero feminino), certo?... não completamente... porque o comentarista "dissolve" o composto para tornar o seu significado completamente "claro" (asim, "claro" é uma piada). Veja-o dissolvido: "teṣāṁ bhāvo yasyāḥ sā" ou "aquilo cujo estado ou condição lhes pertence". A quem? A Śiva, Śakti e Sadāśiva (os três primeiros tattva-s ou categorias). É por isso que ele os nomeou em primeiro lugar, entendeu, pelo amor de Deus?, hehe.

Depois, ele explica o termo "īśvaravidyā-mayī" como o Samānādhikaraṇabahuvrīhi (Locativo) "īśvaravidyāprakṛtiḥ", um composto que ele dissolve desta maneira para comunicar o verdadeiro significado: "īśvaravidye prakṛtiryasyāṁ sā" ou "aquilo no qual a natureza é Īśvara e Sadvidyā". Esses são os nomes dos tattva-s 4 e 5, respectivamente. No final, escreveu "tathā iti" (às vezes escrito como "tatheti" também), para dar ênfase. Pode ser traduzido como "sim!" nesse contexto, isto é, "sim, terminei de destruir o leitor!", hahaha. Brincadeira!

Muito bem, para simplificar a sua complicada vida como aspirante à libertação final, traduzi tanto "tām" quanto "mayīm" ("tā" e "mayī" declinados no caso Acusativo) como: "composto de". Como resultado, o significado da estrofe está muito mais compacto agora, equilibrando literaridade e legibilidade, na minha opinião. É, a minha opinião certamente não foi muito divertida, mas a vida é difícil, como você sabe, hehe. Se o seu intelecto não pode dar conta de todo esse conhecimento, considere-o como meramente informativo, por favor.Return

4  Caitanya ou Paramaśiva assume a forma de uma Grande Luz que está além de todo o resto dos tattva-s ou categorias, e, por conseguinte, Ele é chamado: Śivatattva ou o tattva "Śiva". Essa Grande Luz reside em todos os experimentadores ou conhecedores (do grande Sadāśivabhaṭṭāraka, que será discutido mais adiante, ao último Sakala ou indivíduo limitado) como o próprio Ser, que está repleto do Deleite da Perfeita Consciência do Eu. É Plena ou Perfeita consciência do Eu porque não é fragmentada (ex.: eu sou dessa forma, eu sou daquela forma, eu quero isso, eu quero aquilo, etc.). Essa consciência de eu fragmentada voltada aos objetos se denomina "ego" (tattva 15) e não é, "de forma alguma". o "Eu" real ou Śiva. Quando alguém se dá conta de Śiva, não está mais interessado no universo. Não quer perceber mais nada além da Sua própria Glória. Nesse momento, os sentidos do Grande Yogī se fecham automaticamente devido ao Seu prakarṣa ou intensidade. É como ver o sol diretamente... você é forçado a fechar os olhos por causa da intensa luz que recebem. Da mesma forma, quando o Grande Yogī ingressa na consciência de Śiva, vê-se forçado a fechar os sentidos por causa da Sua Grande Luz. Essa experiência está sempre cheia de Bem-aventurança. Tal Bem-aventurança é conhecida como Cidānanda ou Alegria da Consciência (Alegria de Śiva).

A investigação dos tattva-s realizada pelo comentarista é tão elementar para as pessoas bem versadas em Trika que ele teve que esclarecer esse ponto dizendo: "Nesse contexto, a investigação dos tattva-s ou categorias (será levada a cabo) em relação a uma pessoa que deve ser instruída", ou seja, será levada a cabo somente para o bem das pessoas que ainda não foram adequadamente ensinadas sobre a teoria da manifestação universal na forma de uma série de trinta e seis tattva-s.

Finalmente, Yogarāja explica o segundo tattva (Śakti ou o Poder Supremo) como Ānanda ou a Bem-aventurança de Śiva, o Afurtunado Senhor que sente, através do Seu Poder Supremo, "Torno-me o universo" (quando Śakti manifesta o terceiro tattva ou categoria). Essencialmente, Śakti é imutável como Śiva, então Ela manifesta o universo NÃO diretamente (visto que não pode se mover nem mesmo um milímetro do Seu Senhor Śiva), mas sim através do Seu grupo de poderes (śakticakra). Essa Śakti, como tattva 2, é inerentemente sem forma como Śiva e é adequadamente chamada "Saṁvid" ou "Consciência Pura". No entanto, quando Ela está a ponto de se manifestar como o terceiro tattva, que você estudará logo em seguida, a Sua forma assume uma leve expansão, porque, nessa condição, Ela está no "estado Semente" de todas as entidades (todos os objetos e sujeitos deste universo). Nesse ponto, Ela aparece como uma sutil Vibração no Seu Luminoso Corpo (impossível definir isso em palavras, porque as mesmas ainda não surgiram nesse nível). Dessa sutil Vibração, o universo inteiro passa a existir. Muito bem, é suficiente por enquanto ou o seu intelecto poderia colapsar com tanta informação dada ao mesmo tempo.Return

5  Essa mesma Śakti, ao empreender a tarefa de manifestar e dissolver o universo, torna-se tanto cheia quanto vazia, ou seja, tanto cheia do universo, que consiste em multiplicidade, quando desprovida de tudo isso quando o universo é dissolvido e removido completamente por Ela. Deve-se notar que o conceito de "Vazio" em Trika não é "verdadeiro Vazio" ("nada" absoluto), mas sim "ausência de objetos" (e NÃO ausência do Ser Supremo como postulam outros sistemas). A teoria que versa sobre o Vazio em Trika não é tão simples, já que, "formalmente", enumera 6 vazios ao descrever as doze etapas do AUM (Leia Meditação 6 para ter uma informação completa sobre tudo o que vou dizer agora, por favor, ou não entenderá a minha descrição):

  • Ūrdhvaśūnya ou Vazio Superior. Esse é o mesmo que a etapa de śakti (experimentada na pele).
  • Adhaḥśūnya ou Vazio Inferior, que se localiza na região do coração.
  • Madhyaśūnya ou Vazio Médio, que se encontra na região da garganta, no palato, no espaço entre as sobrancelhas, na testa e Brahmarandhra (o buraco de Brahmā, situado na coroa, a doze dedos do espaço entre as sobrancelhas).
  • Vyāpinī ou Vyāpikā (Aquela que penetra), localizada na raiz da śikhā (o tufo de cabelo na coroa da cabeça).
  • Samanā (Aquela que está dotado de mente), que se encontra na śikhā (na porção média).
  • Unmanā (Aquela que não tem mente), situada na última parte da śikhā (na ponta).

Essa é a maneira de numerar os seis vazios. No entanto, os autores se referem à palavra "vazio" de diferentes formas ao longo das escrituras. Por exemplo, quando os autores falam sobre "śūnya" ou "vazio", eles "comumente" (mas não sempre!) se referem ao vazio de Māyā (o sexto tattva, que será discutido mais adiante). É por isso que o termo técnico "śūnyātiśūnya" (o Vazio que está além do vazio) deve ser "generalmente" (mas não sempre!) entendido como Mahāmāyā (a Grande Māyā, que opera acima do tattva 6 mas abaixo do tattva 5... essa é uma forma simplificada de descrevê-la, pois consiste em dois aspectos... será discutida mais adiante também, no comentário sobre esta mesma estrofe). Sim, o assunto sobre o Vazio é uma verdadeira confusão!

De qualquer forma, Yogarāja está especificando, aqui, que fala sobre o "mahāśūnyātiśūnya" (o Vazio que está além do grande vazio, isto é, o Vazio que está além da Mahāmāyā ou śūnyātiśūnya). Em outras palavras, está falando sobre a etapa que compreende os tattva-s 3 a 5, onde Śakti está no Seu estado Semente como uma sutil Vibração. Nesses três tattva-s ou categorias, existe sempre total unidade entre "Eu" e "Isto", entre "Eu" e "o universo". Obviamente, como é um "estado Semente", o universo ainda é como um broto. Tudo isso está relacionado à experiência e não à descrição e palavras, mas, como você sabe, o seu intelecto tem que entender isso de alguma forma a princípio. É por isso que me dei ao trabalho de explicar esse tópico, que é frequentemente tão confuso para os principiantes em Trika.

A primeira manifestação de "algo" (ou seja, o terceiro tattva) nesse estado Semente Śakti se chama Sadāśiva (o eterno Śiva). Nesse nível, Śiva (o "Eu") sente "Eu sou Isto", isto é, "Eu sou este universo", mas o universo é indistinto ou nebuloso em Sadāśiva (o terceiro tattva), porque ainda está na sua condição primária. Como expliquei na nota 2, os cinco Poderes mencionados por Abhinavagupta na estrofe são: Cit, Nirvṛti (ou Ānanda), Icchā, Jñāna e Kriyā. Como a palavra "poder" se escreve "śakti" em sânscrito, os autores geralmente nomeiam esses cinco Poderes desta maneira: Cicchakti (derivado de Cit-śakti, o Poder da Consciência), Nirvṛtiśakti ou Ānandaśakti (Poder de Bem-aventurança), Icchāśakti (Poder de Vontade), Jñānaśakti (Poder de Conhecimento) e Kriyāśakti (Poder de Ação). Agora, o comentarista diz que, em Sadāśiva, o Poder de Ação (Kriyāśakti) repousa na "consciência do Eu" (em Śakti, que é uma com Śiva --o "Eu"--), porque o universo ainda é indistinto ou nebuloso, isto é, ainda não está completamente crescido ou maduro. A Kriyāśakti está a cargo de "transformar o universo plenamente crescido ou maduro planejado pela Mente do Senhor" em uma "realidade concreta", mas, nesse estágio, esse Poder está "tirando uma soneca" Nela, na consciência do Eu, já que o universo é meramente "um Desejo" na Sua mente cósmica. Bem, isso é tão difícil de descrever em palavras limitadas! E esse Desejo em Si Mesmo também é um "conhecimento" ou "percepção", ainda que nebuloso em Sadāśiva. É por isso que o comentarista diz que existe predomínio de Jñānaśakti ou Poder de Conhecimento.

O significado do que o comentarista disse está bem claro agora (brincadeira), mas há uma discrepância em relação ao que é estabelecido no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha (estrofe 3 e seu comentário), onde se atribui ao Sadāśivatattva (a terceira categoria) a Icchāśakti (Poder de Vontade) como o Poder predominante aqui, porque, na experiência "Eu sou Isto" (Eu sou o universo), existe predomínio do "Eu" sobre o "Isto" (universo). Como esse "Eu" está associado à "Volição", a Icchāśakti é predominante no terceiro tattva. De qualquer forma, Yogarāja atribui Jñānaśakti (Poder de Conhecimento) como predominante no tattva 3, e não Icchāśakti (Poder de Vontade). Que bagunça! O mistério é resolvido pelo Ṣaṭtriṁśattattvasandoha (estrofe 2 e seu comentário), onde a Śakti (tattva 2) é chamada de "essa muito transparente Vontade", isto é, a Śakti é o independente Poder de Vontade do Senhor. Portanto, há duas interpretações nesse confuso tema. Segundo o ponto de vista tradicional dado no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha, Śakti é, realmente, Icchāśakti (Poder de Vontade), e Ela tem predomínio de Nirvṛtiśakti ou Ānandaśakti (Poder de Bem-aventurança) porque a Soberania e a Supremacia do Grande Senhor aparecem como distintos graus de Assombro e Deleite na Perfeita Consciência do Eu, isto é, em Śakti. Dessa forma, o Seu (Dela) primeiro broto, denominado Sadāśiva (tattva 3), tem predomínio de Icchāśakti (Poder de Vontade), já que Ela, a sua Mãe, é a própria Icchāśakti. Isso foi claro, não foi?

Entretanto, segundo Yogarāja, em Sadāśiva, existe predomínio de Jñānaśakti (Poder de Conhecimento), porque ele parece atribuir Icchāśakti "somente" a Śakti (tattva 2). Essas discrepâncias são comuns ao longo das escrituras de Trika no que se refere ao estudo dos tattva-s ou categorias da manifestação universal. No final, como cada um desses Poderes, isto é, Icchāśakti, Jñānaśakti e Kriyāśakti, também contém os outros dois, todo esse mistério não é tão misterioso afinal. Sim, esse tópico também é extremamente confuso, mas, por enquanto, simplesmente confie em mim.

Finalmente, os experimentadores (Você!) que moram no estado de dar-se conta de que "Eu sou Isto", ou seja, "o universo inteiro é o Meu Corpo", chamam-se "Mantramaheśvara-s" ou grandes senhores do Mantra. Por "Mantra", nesse contexto, os autores nunca estão falando sobre coisas como "Om̐ namaḥ śivāya", "Guru Om̐", "Om̐ namo vāsudevāya", "Hare Kṛṣṇa Hare Rāma", etc., mas sobre coisas como "Aham" ou "Eu" (o Verdadeiro "Eu" e não o mero "ego", que é uma massa de impressões acumuladas na forma de "eu sou dessa forma, eu sou daquela forma", etc). Se alguém se tornou um Mantramaheśvara, então os meus parabéns a ele ou ela, porque é extraordinariamente difícil fazer isso. De fato, ninguém, sem a Sua Graça, pode dar-se conta nem sequer da mais baixa categoria ou tattva (Śuddhavidyā ou Sadvidyā) nesse conjunto de cinco tattva-s superiores. Quando, através da Sua Graça, você sente que o universo inteiro é o Seu próprio Corpo, não é mais um indivíduo limitado sempre "com problemas", tenha certeza disso, mas a própria encarnação do Misericordioso Sadāśiva, que está sempre ocupado conferindo Graça a todos os seres. Paradoxalmente, por meio da Sua Graça, você se torna uma Fonte de Graça para todos.

Todos os estados que se experimentam nos tattva-s 3, 4 e 5 (Sadāśiva, Īśvara e Śuddhavidyā) NÃO se experimentam em um lugar e tempo específicos, pois espaço e tempo ainda não foram manifestados pelo Senhor Glorioso (Você!). Dessa forma, você, como um indivíduo, não pode dizer quando e onde estão residindo os estados. Sim, por conveniência, os Guru-s explicam isso como: "Eles residem no seu Ser, dentro de você", mas isso é só um jeito de falar, porque não existe nenhum "dentro" nesses tão grandes estados de consciência. Por "dentro", esses Guru-s tentam mostrar o fato de que esses estados não são "mundanos", por assim dizer, isto é, não estão "fora de você", mas sim no seu Ser interior. De qualquer forma, como eu disse antes, isso é apenas uma forma de explicar estados que estão além de espaço e tempo. De qualquer forma, o que você chama de "você" (ex: João, Joana, etc.) foi criado em um espaço e um tempo, mas o que "Você realmente é" nunca foi criado! Portanto, Você reside sempre sem espaço e tempo. Sim, isso é uma questão de experiência e não de mera teoria, mas uma coisa é totalmente certa: "Você não é um indivíduo". Se insistir em pensar que é um, você é chamado de "mūḍha" ou uma pessoa que vive em "moha" ou "ilusão". Sim, é uma auto-ilusão, realmente!Return

6  Essa é uma das razões pelas quais ninguém quer estar na situação do Guru. Enquanto é relativamente simples para mim ler todos esses parágrafos "medonhos" compostos por Yogarāja, oitenta por cento do meu tempo é gasto tentando escrever a tradução de maneira legível. E 1000% do do meu tempo é gasto escrevendo essas longas notas explicativas, ou ninguém entenderia absolutamente nada do que o comentarista quis dizer com tudo isso. Ah sim, e é bem provável que essa nota explicativa compita em extensão com a própria Bíblia se eu não conseguir torná-la tão curta quanto possível. Porque a profundidade do conhecimento expressado por Yogarāja "em poucas linhas" é simplesmente gigantesca para o leitor mediano. Além disso, essa é uma das razões pelas quais a maioria das pessoas nunca entende Trika apesar das toneladas de livros que já foram publicados por outros eruditos. O que quero dizer? Que só umas poucas pessoas loucas como eu vão dar-se ao trabalho de explicar a um aspirante todas as complexidades contidas em parágrafos tão profundos como estes do comentário de Yogarāja. A tarefa é "extremamente" tediosa certamente, porque, para um estudioso de Trika, o significado é totalmente claro. De qualquer forma, quando ele ou ela tem que explicá-lo a não eruditos, leva intermináveis horas! Então, dessa forma, certamente, ninguém quer estar na situação do Guru! Foi o que eu disse no começo desta nota. E lembre-se que o Paramārthasāra de Abhinavagupta é dirigido a pessoas que "ainda" devem ser instruídas, ou seja, a principiantes em Trika. Evidentemente, a "qualidade" dos aspirantes da época na qual Abhinavagupta e Yogarāja viveram em um corpo físico era "impressionante" em comparação à "qualidade atual do aspirante mediano". Como a capacidade dos aspirantes atuais é tão "decepcionante", eu, Śiva (e não Gabriel, o indivíduo limitado que está sempre com problemas), fundei o "Shaivismo Não Dual de Rosario", sobre o qual você pode ler no blog e também no Svātantryasūtram e na Svātantryasūtravṛtti.

Bem, explicarei tudo pouco a pouco, com a paciência de um santo, de modo que você possa "engoli-lo" facilmente. Escute: Em primeiro lugar, Yogarāja explica os tattva-s ou categorias 4 e 5 (Īśvara e Śuddhavidyā --também chamada Sadvidyā... sempre prefiro esse nome, porque "Śuddhavidyā", cujo significado literal é "Conhecimento Puro", também é usado para designar um estado de Graça que emerge espontaneamente em um grande Yogī, e, com muita frequência, os aspirantes confundem isso com o quinto tattva, você sabe... oh, outra longa história!--). Devo dizer que a sua explicação é quase "o oposto" da traditional dada em textos como Ṣaṭtriṁśattattvasandoha. Por que "quase"? Porque há algumas coincidências entre ambos os ensinamentos. A coisa toda parece um "erro de digitação" na escritura original, mas é um erro muito grande para ser de verdade, isto é, é muito simplista pensar que alguém escreveu "Īśvara" quando deveria escrever "Śuddhavidyā" e vice-versa. Portanto, você terá que tomar essa interpretação dos tattva-s 4 e 5 como uma nova trazida a nós por Yogarāja.

Por exemplo, Yogarāja afirma que, no Īśvaratattva (a quarta categoria), o Senhor ("Eu") tem a experiência de "Eu sou Isto" --"Eu sou o universo"-- (como em Sadāśiva, o tattva anterior), mas, dessa vez, "Eu" não predomina sobre "Isto", mas sim eles permanecem em total equilíbrio, como os dois pratos de uma balança. Em suma, em Sadāśivatattva, "Eu" predomina sobre "Isto", porque o universo ainda é indistinto ou nebuloso (leia o comentário sobre a estrofe 3 no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha), mas, no Īśvaratattva, o universo ficou mais nítido e, como resultado, alcançou-se um equilíbrio entre "Eu" e "Isto". No entanto, no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha (estrofe 4 e seu comentário), no Īśvaratattva, a experiência NÃO é "Eu sou Isto" (Ahamidam), mas sim "Isto sou Eu" (Idamaham), já que o universo (Isto) predomina sobre o "Aham" ou "Eu". E essa é a diferença entre os dois tattva-s, Sadāśiva e Īśvara, segundo o ensinamento tradicional dado no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha. Ainda assim, como eu disse antes, aqui, Yogarāja não está dizendo "exatamente" isso em relação Sadāśiva e Īśvara. Enquanto a explicação do primeiro "quase" coincide com a dada tradicionalmente, a explicação do segundo NÃO coincide de forma alguma. De acordo com Yogarāja, existe total equilíbrio entre "Eu" e "Isto" em Īśvaratattva.

Por sua vez, Yogarāja explica o quinto tattva (Śuddhavidyā ou Sadvidyā) como "Ahamahamidamidam" ("Eu sou Eu e Isto é Isto), o qual coincide com o ensinamento tradicional exposto no Ṣaṭtriṁśattattvasandoha (estrofe 4 e seu comentário), mas, depois, diz que, nesse nível, o "Isto" (o universo) predomina sobre "Aham" ou "Eu", o que é exatamente a forma como o Ṣaṭtriṁśattattvasandoha explica o Īśvaratattva! Em suma, por um lado, segundo o ensinamento tradicional, o equilíbrio entre "Eu" e "Isto" é alcançado no "Śuddhavidyātattva", e NÃO no Īśvaratattva como postulado por Yogarāja, e, por outro lado, a porção "Isto" predomina sobre a porção "Eu" no Īśvaratattva, e NÃO no Śuddhavidyātattva como indicado aqui por Yogarāja. Que bagunça! Porei tudo em um quadro para que você entenda a minha explicação de uma melhor forma:

Comparação entre o ponto de vista tradicional e o postulado por Yogarāja sobre os tattva-s 3, 4 e 5
Coincidências e diferenças
Tattva Experiência segundo o ensinamento tradicional Experiência segundo o ponto de vista de Yogarāja Poder predominante segundo o ensinamento tradicional Poder predominante segundo o ponto de vista de Yogarāja
Sadāśiva Ahamidam (Eu sou Isto - Eu sou o universo - "Eu" predomina sobre "Isto") Ahamidam (Eu sou Isto - Eu sou o universo - "Eu" predomina sobre "Isto") Icchāśakti (Poder de Vontade) Jñānaśakti (Poder de Conhecimento)
Īśvara Idamaham (Isto sou Eu - O universo é Eu - "Isto" predomina sobre "Eu") Ahamidam (Eu sou Isto - Eu sou o universo - Total equilíbrio entre "Eu" e "Isto") Jñānaśakti (Poder de Conhecimento) Não se especifica claramente
Śuddhavidyā ou Sadvidyā Ahamahamidamidam (Eu sou Eu e Isto é Isto - Eu sou Eu e o universo é o universo - Total equilíbrio entre o "Eu" e o "Isto") Ahamahamidamidam (Eu sou Eu e Isto é Isto - Eu sou Eu e o universo é o universo - O "Isto" predomina sobre o "Eu") Kriyāśakti (Poder de Ação) Não se especifica claramente

E aí está. Como você pode ver agora, ambas as interpretações coincidem entre si e, ao mesmo tempo, diferem "drasticamente" uma da outra. Jñānaśakti predomina no Īśvaratattva segundo o ensinamento tradicional por causa de uma manifestação nítida do universo. Por sua vez, segundo esse mesmo ponto de vista, a Kriyāśakti é predominante no Śuddhavidyātattva porque não há uma apreensão ou percepção mais nítida do universo (Isto). Explica-se claramente toda a questão no comentário sobre a estrofe 4 do Ṣaṭtriṁśattattvasandoha. Embora Yogarāja tenha especificado que Jñānaśakti é predominante em Sadāśivatattva, não disse nada sobre o Poder predominante nos outros dois tattva-s. Só disse, sobre a Śuddhavidyā (lit. Conhecimento Puro), que é chamada assim porque é da essência do Conhecimento (Bodha), o qual é completamente verdadeiro, mas ele não deixou claro qual Poder é predominante nesse quinto nível. Bodha é uma palavra que significa duas coisas em Trika: Consciência e Conhecimento. Nesse contexto, significa "Conhecimento". Como "Eu" (Śiva) apreendo ou percebo o universo mais nitidamente no quinto tattva (Śuddhavidyā), e, ao mesmo tempo, há total unidade entre o "Eu" e o "universo", é bem óbvio por que o quinto tattva é conhecido como "Conhecimento Puro", ou seja, "Conhecimento sobre o universo em total unidade com ele". Pelo termo "puro", sempre se indica total unidade nesse sistema. No entanto, não é a Jñānaśakti (Poder de Conhecimento) que predomina no quinto tattva, mas sim a Kriyāśakti... pelas razões que lhe expliquei antes. Muito bem, é suficiente por enquanto!

Finalmente, duas coisas: Primeiro, Yogarāja disse que os experimentadores ou conhecedores chamados Mantreśvara-s (os senhores do Mantra, os senhores do "Aham" ou "Eu") vivem no quarto tattva (Īśvara). Segundo, o Senhor é representado como o bebê Sadyojāta apontando com o dedo a própria cabeça para mostrar a natureza do Deleite experimentado no quinto tattva (Śuddhavidyā ou Sadvidyā). Por quê? Porque Ele está fascinado enquanto contempla o universo à sua frente, por assim dizer. Como está "tão fascinado", esquece sobre Si Mesmo (é por isso que Yogarāja chegou a conclusão de que a porção ou lado "Isto" predomina sobre a porção ou lado "Eu" na quinta categoria conhecida como Śuddhavidyā, isto é, o universo é tão fascinante que Ele "quase" esquece o Seu próprio Ser). Obviamente, "Aham" ou "Eu" nunca pode ser esquecido "totalmente" na realidade. É por isso que as palavras "predomínio e predominante" são constantemente usadas para explicar esses três tattva-s. Como "Eu" e "Isto" são, em última análise, a mesma Realidade nesse nível de consciência, nenhum dos dois é capaz de eliminar o outro "completamente". Isso é muito claro, né?

Agora, poderia ser levantada uma dúvida sobre por que Yogarāja especificou que o nome do bebê era Sadyojāta [lit. "recém-nascido", de "sadyas (recém) + jāta (nascido)"]. Além da coincidência entre a palavra "bebê" e "recém-nascido", há muito mais em tudo isso. Escute com atenção: o Senhor Śiva é, às vezes, denominado Pañcavaktra porque tem cinco (pañca) bocas (vaktra-s). Os nomes dessas bocas são: Īśāna, Tatpuruṣa, Sadyojāta, Vāmadeva e Aghora. Essas bocas são atribuídas aos cinco primeiros tattva-s, "respectivamente": Śiva, Śakti, Sadāśiva, Īśvara e Śuddhavidyā. Portanto, Sadyojāta é o Sadāśivatattva. Poderia ser esperado que Yogarāja tivesse sido "o bebê Aghora", e não "o bebê Sadyojāta", por razões óbvias, ou seja, porque Aghora é atribuído ao Śuddhavidyātattva. No entanto, Aghora é, na verdade, Sadyojāta... mas com o dedo apontando para a própria cabeça enquanto contempla o universo como se estivesse completamente fascinado... entendeu agora? Então, Yogarāja estava, na verdade, descrevendo Aghora dessa forma: Como Sadyojāta completamente fascinado pelo universo! Agora as coisas parecem mais claras, não? (brincadeira).

Sim, os ensinamentos são difíceis de entender como sempre em Trika, mas, pouco a pouco, você está abrindo caminho em direção ao próprio Ser por meio de todo esse vigoroso esforço realizado pelo seu intelecto. Esse tipo de conhecimento "difícil de engolir" remove a "ignorância intelectual", um dos aspectos da impureza primordial conhecida como Āṇavamala. Se essa ignorância intelectual não for removida durante a vida, ainda que uma pessoa possa ter tido um vislumbre do próprio Ser por meio de meditação e métodos similares, não desfrutará do seu estado de Libertação até que o corpo caia. Em suma, se a ignorância intelectual (a ignorância sobre as escrituras) persistir nessa pessoa, mesmo que tenha tido uma verdadeira experiência do próprio Ser, não desfrutará do estado de Libertação em vida (jīvanmukti) e terá que esperar que a mãe morte chegue para fazer isso. Portanto, dizer que "alguém é um jīvanmukta ou libertado em vida" e, ao mesmo tempo, dizer que "é ignorante sobre as escrituras" é uma absoluta contradição. Isso nunca é possível! Para ser totalmente libertado enquanto o corpo está vivo deve-se ter um verdadeiro ato de dar-se conta do Ser, em conjunção com um sólido conhecimento das escrituras. Se você somente se der conta do Ser nem nenhum conhecimento das escrituras, essa experiência será perdida gradualmente enquanto você está no corpo. A única maneira de impedir que se perca enquanto o corpo estiver vivo é por meio do conhecimento das escrituras, por meio de todo esse conhecimento intelectual. As pessoas que dizem que "estudar as escrituras é inútil porque apenas a meditação é efetiva em produzir Libertação" são completamente ignorantes, é não há dúvidas sobre isso. Isso não é invenção minha, como sempre digo, mas sim um ensinamento que é postulado pela própria tradição do Trika.Return

7  Yogarāja exagerou um pouco aqui. O conhecimento mostrado por ele evidentemente não é para principiantes de Trika, exceto que os aspirantes da sua época tivessem a capacidade de videntes védicos! Não estou brincando, e agora você você verá por que disse isso. Tornarei esse pequeno parágrafo o mais claro possível dentro das limitações das palavras. Primeiro de tudo, os experimentadores ou conhecedores (pramātā-s) do Śuddhavidyātattva (também chamado Sadvidyātattva) levam o nome de "Mantra-s" (sim, o seu nome "coincide com" o das fórmulas sagradas!). O chefe de todos esses Mantra-s é "Anantabhaṭṭāraka". Foi ele que criou 70 milhões de mantra-s, entre os quais considera-se o "Om̐ namaḥ śivāya" como o rei de todos eles. Esses mantra-s ou fórmulas sagradas atuam como indicadores ou designadores desses experimentadores (isto é, desses Mantra-s que residem nesse quinto tattva ou categoria). A palavra "vācaka" (indicador, designador) é uma palavra com o poder de manifestar "algo" por si só. Dessa forma, cada um desses 70 milhões de mantra-s é um sujeito, e nunca um objeto. Todos os mantra-s utilizados pelos Guru-s humanos foram "criados" por Anantabhaṭṭāraka. Ah sim, isso é muito complexo, mas estou falando a verdade. Portanto, todos esses mantra-s são sujeitos e nunca objetos, e também, como foram criados pelo divino Anantabhaṭṭāraka, todos eles estão dotados de onisciência e onipotência. Isso explica por que um mantra dado pelo seu Guru é tão importante. Obviamente, estou resumindo esse assunto, ou terminaremos com outra nota do tamanho da Bíblia.

Agora, Anantabhaṭṭāraka fez algo mais: Pegou 8 Rudra-s (seres libertados) e transformou-os em 8 Vidyeśvara-s ou senhores do Conhecimento. Os seus nomes são os seguintes: Śikhaṇḍī, Śrīkaṇṭha, Trimūrti, Ekarudra, Ekanetra, Śivottama, Sūkṣma e Ananta. Esses 8 seres libertados, embora residam no quinto tattva, descem até a porção superior da Mahāmāyā... um pouco abaixo do quinto tattva propriamente dito, mas sempre acima do sexto tattva (isso será discutido mais adiante, então não se preocupe). Por que fazem isso? Para elevar os paśu-s (lit. animais, bestas), ou seja, os indivíduos limitados, que são "vācya-s" ou "indicados, designados". O que quero dizer com isso? A palavra "vācya" significa "um objeto", isto é, algo que pode ser indicado ou designado. Um exemplo simples: O "vācaka" (indicador ou designador) "árvore" indica ou designa o "vācya" (indicado ou designado) ou "objeto" conhecido como "uma árvore". Assim, "A palavra indica ou designa o objeto", está entendendo? Dessa forma, tudo que é "vācaka" é sempre "um sujeito" (voltado à subjetividade) e tudo o que é "vācya" é "um objeto" (voltado à objetividade). Alguns leitores poderiam dizer, "Mas como poderiam os indivíduos limitados ser chamados de vācya-s ou objetos se eles são, evidentemente, sujeitos?". São chamados assim porque esses indivíduos limitados estão imersos em "objetividade", isto é, dependem de objetos e, consequentemente, é como se eles mesmos fossem objetos também. Tudo o que é manifestado a partir do próximo tattva (o sexto, chamado Māyā) abaixo tem a ver com a "objetividade". Como os indivíduos limitados são assim, isto é, "indivíduos limitados", pois estão sujeitos ao Māyātattva (o sexto tattva), todos eles estão voltados à objetividade na maior parte do tempo. É por isso que eles são adequadamente chamados "vācya-s" ou "imersos em objetividade". Não acredita? O que você faria se lhe faltasse água ou comida? Poderia inclusive matar outra pessoa para conseguir esses "objetos". Como você, como um indivíduo limitado, é assim, como um animal ou besta (não estou brincando), é chamado de "vācya" ou "imerso em objetividade". Se o leitor não é um indivíduo limitado, minhas desculpas. Obviamente, 99,9999% de todas as pessoas do planeta são indivíduos limitados, as probabilidades estarão em meu favor na maior parte do tempo.

Além disso, embora a palavra "paśu" (animal, besta) possa soar pejorativa, é totalmente precisa para definir a condição de um indivíduo limitado. Está sempre com o "pāśa" (coleira) ao redor do pescoço, constantemente vivendo em escravidão, constantemente atado a objetos externos, outras pessoas, empregos, dinheiro, etc. O seu estado é tão infeliz que nem consegue acreditar. Ignora tudo sobre Anantabhaṭṭāraka e seus 70 milhões de mantra-s, por exemplo. É como se o seu gato pudesse saber algo sobre os arquivos no seu computador. Isso não ocorre, não é? E, se algum dia, um paśu finalmente entender que foi Anantabhaṭṭāraka que criou os 70 milhões de mantra-s disponíveis para alcançar libertação final, essa pessoa não é mais um paśu... ou pelo menos não é mais o mesmo paśu de antes. Poderia ser um tipo de paśu+, hahahahaha. Com relação aos paśu-s "normais" que se podem ver todo santo dia, estão a todo momento cheios de contradições que raramente notam. Por exemplo, dizem seguir uma religião que professa "o amor pelos inimigos", mas, ao mesmo tempo, vivem constantemente pela regra de "olho por olho". Chamam isso de "justiça", mas é mera "vingança". Como afirmou Gurdjieff, se a minha memória não falha: "Como podem amar os inimigos se nem amam os amigos?". Oh, esse Gurdjieff é sempre tão engraçado. Em suma, não percebem que o seu comportamento baseado na regra de "olho por olho" é uma gigantesca contradição em relação às suas crenças religiosas, mas, devido ao poder da mãe ignorância, podem continuar vivendo "em paz". Você pode ver por que o nome "animal ou besta" foi usado corretamente no caso deles?

Se ainda não está convencido, pode considerar todas essas pessoas "civilizadas" que, "neste exato momento", estão pensando muito sobre como construir armas que sejam capazes de matar a maior quantidade possível de seres humanos. De qualquer forma, ainda que o "paśu" seja "bom", isso também é "por sorte", e não um fato nascido do seu próprio livre arbítrio na forma de: "Decidi que sempre serei bom". Sim, isso é muito difícil de engolir, mas, se alguém pensar que não está atado, existem duas possibilidades: ou ele é um libertado em vida (um jīvanmukta) ou outra pessoa se enganando. A questão denominada "libertação final" é significativa quando a pessoa se dá conta da sua escravidão, e não antes. Pessoas que "imaginam" que são Livres como o Senhor não buscarão a libertação final, porque: Qual o objetivo de fazer todo esse duro esforço se já estão libertados? Nunca subestime a mãe ignorância e os seus truques. Ela tem truques simples, mas são muito efetivos.

Todos esses indivíduos limitados, sejam bons, ruins ou algo mais, são iguais no final: Totalmente limitados e constantemente sujeitos à mãe ignorância e seus truques. Para elevá-los a partir da sua infeliz condição, Anantabhaṭṭāraka criou esses 70 milhões de mantra-s iniciou esses 8 Rudra-s (seres libertados) para que pudessem tornar-se 8 Vidyeśvara-s. Por meio desses Vidyeśvara-s, por exemplo, os 70 milhões mantra-s são passados para a humanidade. O Vidyeśvara que conheci pessoalmente é Ekarudra. O nosso encontro ocorreu fora da estrutura espaço-temporal, obviamente. Por essa razão, não posso dizer onde realmente aconteceu tal encontro. Portanto, a minha linha de conhecimento vem através do que Ekarudra me deu. Para pessoas que pensam: "Oh não, não foi Ekarudra, mas sim o próprio Śiva!", sim, já sabia isso. Mas, assim como não se podem ter todos os Guru-s humanos ao mesmo tempo só porque todos são o próprio Śiva, ou assim como alguém tem um pãe e uma mãe, e não todos os pais e mães do mundo porque todos são o próprio Śiva, da mesma forma, todo esse conhecimento é passado a mim por meio de Ekarudra "em sua maior parte", e não por todas as outras deidades. Se você receber algo do presidente do seu país, quer ele ou ela o dê pessoalmente ou por meio de outras pessoas, é a mesma coisa ao final. Quanto mais miserável for o paśu, mais ficará preocupado em receber o conhecimento divino SOMENTE pela Maior Deidade, e não por uma menor. Quando alguém tem realmente fome, comerá qualquer coisa que lhe for dada, seja esse alimento dado pelo próprio Deus ou por um simples ser humano.

Há mais um mistério contido nos ensinamentos de Yogarāja: Ele estabelece que os Mantra-s querem elevar os indivíduos limitados até o nível de Mantramaheśvara-s e Mantreśvara-s (os experimentadores que residem nos tattva-s 3 e 4), mas omitiu o nível dos próprios Mantra-s (os experimentadores que moram no tattva 5)! Como a explicação de por que ele disse isso não é tão simples, simplificarei as coisas para você: O principal dos Mantramaheśvara-s se chama "Sadāśivabhaṭṭāraka". Como eu te disse em uma nota anterior, Sadāśiva (isto é, Sadāśivabhaṭṭāraka e o resto dos experimentadores no tattva 3) está sempre disposto a conferir Graça divina aos indivíduos limitados. De qualquer forma, nem Sadāśiva e nem Īśvara (nenhum dos experimentadores que vivem nos tattva-s 3 e 4) pode dar um mantra ou fórmula sagrada que confere libertação a um indivíduo limitado. São impotentes em relação a isso. Mas Śuddhavidyā (ou seja, Anantabhaṭṭāraka e seus Vidyeśvara-s, além do resto dos experimentadores que vivem no tattva 5) pode fazer isso. Estou falando a verdade. Só confie em mim por enquanto, por favor.

Portanto, o Śuddhavidyātattva é efetivo em passar os 70 milhões de mantra-s à humanidade "por meio da Graça proveniente do Sadāśivatattva". Sim, o compassivo Sadāśiva é uma forma assumida pelo Senhor Śiva, e, nesse sentido, é sempre Ele que concede Graça divina, mas o Seu Jogo funciona "assim". É por isso que Yogarāja especificou: "até (o nível) dos Mantramaheśvara-s e Mantreśvara-s --grandes senhores do Mantra e senhores do Mantra, respectivamente-- através da natureza essencial da divina Graça (de Śiva)". Assim, o composto "anugrahasvabhāvāt" tem um duplo sentido: (1) Como um simples composto determinativo traduzido desta forma: "através da natureza essencial da divina Graça (de Śiva)"; ou (2) Como um composto atributivo traduzido assim: "através Daquele cuja natureza essencial é a divina Graça (de Śiva)", isto é, através de Sadāśiva. E, visto que todos os 70 milhões de mantra-s criados por Anantabhaṭṭāraka foram manufaturados pela divina Graça do Grande Senhor, também estão dotados de divina Graça. Agora, você pode perceber como os ensinamentos de Yogarāja são profundos!

O parágrafo inteiro escrito por Yogarāja também poderia ser traduzido de forma alternativa segundo os meus estudos, mas não gostei do resultado final, porque simplesmente não consegui entendê-lo dessa forma. Se algum dia conseguir, ou seja, se algum dia o resultado final for confirmado por alguns dos 64 Bhairavatantra-s ou outra escritura autorizada do Trika, incluirei essa forma de traduzir o parágrafo, prometo. Esse tipo de tradução alternativa ocorre com muita frequência devido à natureza do próprio sânscrito. É tão rico em vocabulário e estrutura que, com muita frequência, pode ter dois ou inclusive mais modos de interpretar a mesma coisa. Muito bem, chega de revelar esses mistérios por enquanto!Return

8  Yogarāja continua pisando no acelerador. Vá com calma, porque explicarei tudo detalhadamente agora. Começarei com um diagrama simples para que você entenda visualmente as coisas na prática:Mahāmāyā

Analisemos os últimos parágrafos do comentarista:

(1) "Embora não haja diferença no que concerne à forma ou natureza do Conhecimento no caso dos experimentadores ou conhecedores (chamados) Vidyeśvara-s, (que residem) nesse Śuddhavidyātattva, existe (uma certa) disseminação de diferença --dualidade-- que foi manufaturada pela (Sua) Māyāśakti --Seu poder para manifestar diferença ou dualidade--."

Com essa declaração, Yogarāja quis dizer o seguinte: Os 8 Vidyeśvara-s são Mantra-s (experimentadores ou conhecedores que vivem no quinto tattva). De qualquer forma, para comunicar os 70 milhões de mantra-s em conjunção com ensinamentos adicionais aos indivíduos limitados (começando pelos Pralayākala-s, que estão dormindo profundamente em Māyātattva, a sexta categoria), têm que descer um pouco abaixo do tattva 5 (você pode ver isso no diagrama localizado à direita). Descem ao que é conhecido como "Parāmahāmāyā" ou a "porção superior" (parā) de Mahāmāyā". Mas o que é Mahāmāyā afinal? É a região entre os tattva-s 5 e 6 (entre Śuddhavidyā e Māyā), que foi manufaturada pela Sua Māyāśakti ou Poder para manifestar diferença ou dualidade. "Māyāśakti" NÃO é o "Māyātattva" de forma alguma. Māyāśakti é simplesmente o Seu Poder para produzir dualidade onde deveria haver somente não dualidade. Como os 8 Vidyeśvara-s tiveram que descer dessa forma à Parāmahāmāyā, começaram a ser um pouco afetadas pela "radiação do Āṇavamala (a impureza primordial que gera falta de plenitude na forma de "Eu não sou Pleno, eu não sou perfeito")", por assim dizer. O que aconteceu a eles? Isto: Enquanto permaneciam no quinto tattva, sabiam que eram Śiva e, ao mesmo tempo, sentiam plena unidade com o lado ou porção "Isto", ou seja, com o universo. No entanto, pela sua absoluta compaixão para com os indivíduos limitados, aceitaram entrar na Parāmahāmāyā para cumprir a sua missão como "os que transmitem ou comunicam" mantra-s e ensinamentos divinos à humanidade, mas tiveram que pagar um preço por isso: Na Parāmahāmāyā, ainda sabem que "eles são o Próprio Śiva", ou, como Yogarāja expressou de forma realmente tão difícil: "não há diferença no que concerne à forma ou natureza do Conhecimento no caso dos experimentadores ou conhecedores (chamados) Vidyeśvara-s". Em suma, mantêm o seu Conhecimento de que são Śiva essencialmente. Porém, como entraram na Parāmahāmāyā, que é uma manifestação da Sua Māyāśakti (poder máyico que produz dualidade), perderam "a sua experiência de unidade com o universo" (que tinham quando moravam no quinto tattva). É por isso que Yogarāja diz essa coisa estranha: "existe (uma certa) disseminação de diferença --dualidade--". Finalmente, o conceito de Parāmahāmāyā (Mahāmāyā superior) é "tacitamente" estabelecido por Yogarāja quando ele diz que essa dualidade "foi manufaturada pela (Sua) Māyāśakti --Seu poder para manifestar diferença ou dualidade--". Bem, esse parágrafo está bem claro agora, não está?

(2) Depois disso, Yogarāja cita os Āgama-s ou escrituras reveladas (não compostas por mão humana), isto é, os famosos 64 Bhairavatantra-s: "Mahāmāyā --a grande Māyā-- (está) acima do Māyātattva --o sexto tattva ou categoria da manifestação universal--...".

E você pode ver isso no diagrama acima, onde se mostra a Mahāmāyā com as suas duas porções: Parāmahāmāyā (porção superior da Mahāmāyā) e Aparāmahāmāyā (porção inferior da Mahāmāyā).

(3) Depois, o comentarista descreve o que expliquei previamente sobre os Vidyeśvara-s e o preço que tiveram que pagar pela sua entrada na Parāmahāmāyā para ajudar os indivíduos limitados que estão constantemente em problemas devido à dualidade: "Como resultado, diz-se que os Mantra-s --os experimentadores ou conhecedores pertencentes ao quinto tattva-- que moram ali --na Mahāmāyā, ou, "estritamente falando", na Parāmahāmāyā, a porção superior da Mahāmāyā-- (se tornam) "átomos" --indivíduos com certa limitação nesse nível-- devido à (sua) entrada na Mahāmāyā."

A limitação mencionada é que os Vidyeśvara-s --que são realmente Mantra-s ou experimentadores que residem originalmente no tattva 5-- deixaram de sentir unidade com o universo devido à sua descida à Parāmahāmāyā. Obviamente, devido à influência do Āṇavamala (a impureza que pertence ao aṇu --lit. átomo-- ou indivíduo limitado), tornaram-se "átomos" também, ou seja, indivíduos com essa limitação que expliquei antes. De qualquer forma, puderam manter o seu estado de dar-se conta do Ser, isto é, efetivamente se dão conta de que são Śiva, apesar da limitação que tiveram que assumir na sua descida.

(4) Finalmente, Yogarāja fala sobre os Vijñānākala-s, que moram na Aparāmahāmāyā (a porção inferior da Mahāmāyā): "Os experimentadores ou conhecedores (denominados) Vijñānākala-s, que (residem) em cima do Māyātattva --a sexta categoria-- e embaixo do Śuddhavidyātattva --a quinta categoria--, (são) um recipiente do Āṇavamala."

A palavra "bhājanam" (recipiente) significa literalmente "que participa de". Consequentemente, os Vijñānākala-s são experimentadores que estão influenciados pelo Āṇavamala e, portanto, também são "átomos" ou "aṇu-s" (indivíduos limitados). A sua limitação é a seguinte: Mantêm "vijñāna" ou conhecimento sobre a sua unidade com o Senhor Śiva. De qualquer forma, são "akala-s" ou "desprovidos de Poder ou Śakti". Em suma, não podem mover-se de forma alguma como no caso dos experimentadores superiores (Mantra-s, etc.), mas sim permanecem "fixos" nesse estado como Śiva "sem movimento". Pessoas estranhas realmente, haha! Brincadeiras à parte, os Vijñānākala-s não têm "kartṛtva" ou "estado de fazedor", devido ao forte aperto do Āṇavamala nesse nível. Experimentadores inferiores, p. ex.: Sakala-s (experimentadores dotados de ego, etc.), têm "kartṛtva" (estado de fazedor) extremamente limitado, mas quase nada de "vijñāna" ou consciência da sua unidade com o Grande Senhor (Śiva). No lado positivo, os Vijñānākala-s são livres dos outros dois mala-s ou impurezas (Māyīyamala e Kārmamala), em outras palavras, não veem nenhuma diferença ou dualidade (o que os torna livres do Māyīyamala ou a impureza máyica que dissemina diferenças) e, ao mesmo tempo, como são imóveis, não realizam ações (o que os torna livres do Kārmamala ou a impureza relacionada ao sentimento de fazedor de ações). Muito bem, se você precisar de mais informações sobre todas essas sutilezas sobre Vijñānākala-s e mala-s, leia Trika 4, por favor.Return

9  O comentarista foi muito longe de novo. Se ele continuar escrevendo assim, ficarei adicionando notas explicativas até o fim do universo. Agora ele está falando sobre Turya, o Quarto Estado, que devo explicar a você concisamente ou essa nota será extremamente longa. Escute: Existem três estados comuns de consciência conhecidos como vigília (jāgrat), sono (svapna) e sono profundo (suṣupti). A natureza desses estados é que mudam constantemente, ou seja, tem que se mover de um estado ao próximo constantemente. Por outro lado, a Testemunha de todos esses estados (Você!) é um Estado que nunca muda. Esse estado se chama Turya ou "o Quarto Estado" porque está além dos outros três estados comuns.

Agora, os cinco primeiros tattva-s têm como essência esse grande Estado de Turya, mas há uma pequena diferença entre os dois primeiros tattva-s e os três restantes: Nos primeiros tattva-s, em Śivatattva e Śaktitattva, NÃO existe universo. Existe somente "Aham" ou "Eu" ali. Como resultado, a Testemunha (Você!) está como se estivesse hibernando nesse nível, já que não há nada para testemunhar devido à ausência de um universo. Nesses dois primeiros tattva-s, Você desfruta somente de Consciência e Bem-aventurança (Cit e Ānanda). No entanto, quando a porção "Isto" aparece no terceiro tattva, a Testemunha (Você!) fica como se tivesse sido despertada da Sua hibernação em Consciência e Bem-aventurança. Dentro do reino dos tattva-s 3, 4 e 5, o Estado de Turya ou Testemunha está plenamente funcional devido à presença de um universo para contemplar. Mas qual é a diferença, então, entre todos esses tattva-s no que diz respeito à experiência de Ser? O assunto é muito complexo, mas vou resumi-lo para você agora: "A experiência de Ser nos dois primeiros tattva-s é Plena porque não há absolutamente nenhum universo, e Aham ou o Eu Real é sentido completamente. No terceiro tattva, a experiência de Ser continua a ser completa, mas há uma leve diferença em qualidade, já que o universo aparece diante do Senhor (Você!). No quarto tattva, o nível de experiência de Ser continua perdendo qualidade, até que, no quinto tattva, a qualidade não é tão boa como era no terceiro, por exemplo".

Sim, a experiência de Ser, inclusive no quinto tattva (em Śuddhavidyā ou Sadvidyā), é como a do Reino dos Céus quando comparável à miserável felicidade de um indivíduo limitado que vive a todo momento imerso em objetividade ("estou feliz", "estou triste", "preciso disso", "sinto falta daquela pessoa", "observo isso", "tenho muito dinheiro", "estou no topo do mundo", "estou para baixo", etc.). A experiência de um indivíduo limitado (todos os experimentadores do tattva 6 abaixo) em relação ao próprio Ser é abominável em comparação com a de Anantabhaṭṭāraka (o principal dos Mantra-s do Śuddhavidyātattva), e nem se compara à sentida nos tattva-s 1 e 2. Quero dizer, a Bem-aventurança é tão gigantesca nesses primeiros cinco tattva-s que um segundo de Alegria em qualquer um deles equivale a vidas inteiras cheias de felicidade comum. Tenho experiência direta com isso, e, consequentemente, não tenho nenhuma dúvida sobre isso. Sim, é uma questão de experiência então. Por que a maioria das pessoas se comporta da forma como o faz? Porque sentem o seu "Eu" incorretamente. Se pudessem experimentar o seu "Eu" Real, isto é, o Estado de Turya, parariam de comportar-se dessa forma agora mesmo. Por exemplo, estão tão interessadas em todos esses objetos e pessoas ao redor porque não tiveram uma experiência de Bem-aventurança gigantesca. Como não conhecem nada melhor que "essa vida mundana", pensam que precisam correr atrás de tudo isso, fazer todas coisas como mendigar objetos, amor, bem-estar corporal e coisas assim. Quando você tem uma verdadeira experiência do seu próprio Ser ou verdadeiro "Eu", a felicidade comum parece "dor horrível" em comparação, pelo menos "a princípio", devido ao drástico contraste. Não estou brincando, mas sim dizendo a verdade.

Então, esse Estado de Turya que mora nos tattva-s 1 a 5 permanece como uma massa compacta de Consciência durante todos os outros três estados comuns. Turya nunca deixa a própria natureza como o Perceptor ou Testemunha. Ainda assim, Turya pode se misturar com os outros estados e gerar formas híbridas, por assim dizer (p. ex.: Turya-jāgrat, uma mistura de Turya e vigília). Mas o Estado do Grande Senhor (Paramaśiva) está sempre além de Turya, isto é, a Sua natureza essencial é UNICAMENTE Turyātīta (o Estado além do Quarto). A principal característica de Turyātīta é que nunca se mistura com nenhum outro estado de consciência. É um estado completamente autônomo e único desfrutado apenas por Paramaśiva. Também é conhecido como o Estado dos Grandes Santos. Como Paramaśiva está tanto perto quanto longe, tanto em todo lugar quanto em lugar nenhum, ninguém pode dizer o que Ele é e o que o Seu Estado é, certamente. Portanto, todas as descrições relacionadas a tais questões serão sempre insuficientes. Chega disso então!Return

10  Finalmente, Yogarāja resume o conteúdo inteiro do seu comentário dizendo o seguinte: Paramaśiva (o Śiva Supremo) aparece em três formas: (1) Como Kartā --Fazedor ou Agente-- nas categorias 1 e 2, isto é, em Śivatattva e Śaktitattva; (2) como Karaṇa --Causa ou Instrumento de ação-- nas categorias 3 e 4 --Sadāśivatattva e Īśvaratattva--, as quais se transformam na categoria 5 --Śuddhavidyātattva ou categoria do Conhecimento Puro--, em outras palavras, Sadāśivatattva + Īśvaratattva = Śuddhavidyātattva (a categoria que atua como Causa ou Instrumento de ação); (3) como Kārya --efeito-- ou Kriyā --atividade-- na forma de todas as categorias desde a sexta (Māyātattva) até a última (a 36a), conhecida como Pṛthivītattva (embora também possa ser chamada: Dharātattva, ou inclusive Kṣititattva, como os termos pṛthivī, dharā e kṣiti significam a mesma coisa: terra).

Muito bem, essa foi uma rica estrofe acompanhada por um complexo comentário que nenhum principiante (ou inclusive aspirante médio) de Trika que viva nesta época poderia ter entendido sem o auxílio do Guru (o Poder de Deus que concede Graça), que aparece como quem está escrevendo agora mesmo. Que esse Grande Paramaśiva que toma todas essas formas (principiante, aspirante intermediário, Guru, escritura, Abhinavagupta, Yogarāja, etc.) seja louvado para sempre!Return

Ao início


 Estrofe 15

(Abhinavagupta) expressou a natureza essencial do Māyātattva --a sexta categoria--1 :


Essa Liberdade do Grande Senhor, a qual (é) Suprema (e) capaz de levar a cabo o que é difícil de realizar, (é) a Deusa Māyāśakti (ou o Poder) de Auto-ocultação de Śiva||15||


A Liberdade (ou) capacidade de manifestar o universo pertencente ao Mais Alto Senhor, a qual (é) Suprema (ou) totalmente Independente --lit. "não dependente de nenhum outro"--, (também é conhecida como) esse mesmo poder ou śakti —cujo nome é Māyā — desse Śaktimān ou Possuidor de Śakti --epíteto de Śiva--.

Ela (é conhecida como) Māyā (porque) a manifestação que consiste em conhecedores (e) cognoscíveis, a qual termina no Dharātattva --o 36o tattva, o último--, é tornada mensurável —é totalmente limitada— por Ela, ou também (se chama) Māyā (porque) ilude o universo2 .

Considerando (o fato de) que essa (Māyāśakti) é relacionada ao Deus --Śiva--, que tem o hábito jogar, (Ela é denominada) a Deusa. No entanto, "(Ela) não é, de forma alguma, uma Māyā que é diferente (do Seu próprio Senhor) como (a) dos seguidores da doutrina de Brahma"3 .

De que tipo (é) essa Liberdade? (Abhinavagupta deixa isso claro na estrofe:) "É capaz de levar a cabo o que é difícil de realizar". (É assim: "durghaṭasampādana" porque) "Pode fazer ou efetuar o que é difícil", (isto é, essa Sua Liberdade) leva a cabo (ou) conduz à obtenção do que é difícil de realizar, (ou seja,) do efeito --a manifestação universal--, que aparece na forma de (todos esses) sujeitos (e) objetos4 .

Essa mesma Māyāśakti (é, também,) o (Poder) de Auto-ocultação de Śiva, do Que assume o estado de indivíduo limitado pelo Seu próprio Libre Arbítrio. (O Seu Poder de Auto-ocultação também) é conhecido como ocultação da própria natureza essencial (e) consiste na tríade de impurezas que começa com o Āṇavamala5 ||15||

Pular as notas

1  Cuidado com essa sutileza!: "(Abhinavagupta) expressou a natureza essencial do Māyātattva --a sexta categoria--", isto é, descreveu, por meio da estrofe atual, a natureza essencial ou a essência do sexto tattva, mas NÃO o sexto tattva propriamente dito. Em outras palavras, Abhinavagupta está descrevendo Māyāśakti na estrofe atual, e NÃO o Māyātattva. A Māyāśakti é o Seu Poder de produzir dualidade, sendo o Māyātattva somente "um" dos Seus produtos. É muito importante compreender a diferença entre Māyāśakti e Māyātattva, ou haverá confusão extra. Por exemplo, a Sua Māyāśakti gerou a Mahāmāyā explicada no comentário sobre a estrofe anterior. Depois disso, Ela gerou o Māyātattva (a sexta categoria). Portanto, a Māyāśakti é um "Poder" do Senhor, que manifesta várias coisas, por exemplo, o Māyātattva, mas Ela NÃO é o próprio Māyātattva, mas sim a natureza essencial ou essência. Fui claro o suficiente? Muito bem!Return

2  Como eu disse antes, Māyāśakti (ou simplesmente Māyā) NÃO é Māyātattva. Māyāśakti é Svātantrya ou a Liberdade Absoluta do Mais Elevado Senhor para manifestar o universo junto com toda a dualidade contida nele. Essa Liberdade é "ananya-apekṣa" ou "dependente de nenhum outro", ou seja, é completamente Independente porque não depende de ninguém mais. Pertence a Śaktimān, o Possuidor de Śakti (o Possuidor de Svātantrya, como Svātantrya e Śakti são sinônimos). Somente Śiva é o Possuidor de Śakti, e mais ninguém, isto é, nenhum indivíduo limitado dotado de ego pode arrogar-se o "status" de Possuidor de Śakti. E, como Śakti é sempre o Verdadeiro Fazedor, nenhum indivíduo limitado faz nada. Se alguém disser: "eu faço", então ele ou ela é uma pessoa que deu conta da sua unidade com Śiva ou apenas outra pessoa iludida (a grande maioria das pessoas neste planeta). A ilusão de ser o Verdadeiro Fazedor é esmagadora neste planeta. Pode ser vista em ação ao longo de todo o dia, com indivíduos limitados constantemente prometendo que farão coisas que nunca poderão fazer no final. As pessoas costumam reclamar sobre esses indivíduos limitados que prometem e nunca cumprem as promessas, mas, na verdade, isso é tudo uma ilusão, pois, se as pessoas que reclamam de outras que não cumprem as promessas estivessem na mesma posição, iriam comportar-se da mesma forma: Completamente impotentes! Como essas pessoas não entendem essa simples verdade, ficarão durante o dia todo protestando sobre outras pessoas que não fazem isso ou aquilo como deveriam. Alguém está sacaneando a todos. Quem? A Sua Māyāśakti!

É por isso que se denomina Māyāśakti ou simplesmente Māyā (não o Māyātattva), porque Ela "ilude" o universo. Além disso, o comentarista adicionou o significado comum de Māyā derivado da raiz "mā" (medir) quando disse que a manifestação que consiste em conhecedores e cognoscíveis (em sujeitos e objetos), que finaliza na última categoria ou tattva (terra, o 36o tattva), é "tornada mensurável" ou "totalmente limitada". Por quê? Porque a Māyāśakti faz isso, isto é, torna finito o Infinito Senhor. Faz com que Ele, que está desprovido de limites, se torne um indivíduo limitado constantemente à mercê de tudo ao seu redor. O significado está claro agora!Return

3  Ela é conhecida como "a Deusa" porque está relacionada ao Deus, a Śiva, que tem o hábito de jogar, ou seja, que tende a jogar Consigo Mesmo. Por exemplo, Ele é um, mas, ao mesmo tempo, aparece como "muitos" simplesmente para jogar Consigo Mesmo. Parece estar sofrendo muito, mas, ao mesmo tempo, "curte", e por aí vai. Quando o sábio diz isso, está falando sobre Você e não sobre nenhum outro "Ser" chamado Śiva. Entretanto, essa Māyāśakti tal como estabelece o Trika não é como a postulada pelos seguidores da doutrina de Brahma (os seguidores do sistema Advaitavedānta), que parece distinta e separada do Seu Senhor. Para mais informação, leia Confusão entre Vedānta e Trika no Blog. Em poucas palavras: "O não dualismo é a Verdade, enquanto o dualismo é o Jogo". Ele é Único e essa é a Verdade, mas, ao mesmo tempo, torna-se "muitos"... e esse é o Seu Jogo.Return

4  Yogarāja pergunta: "De que tipo é essa Liberdade do Senhor?". Depois, responde a própria pergunta por meio das palavras de Abhinavagupta: "É capaz de levar a cabo o que é difícil de realizar". Segundo a sua própria interpretação, o comentarista explica dizendo que tarefa mais difícil de realizar é a manifestação do universo. Sim, usou palavras difíceis para dizer a mesma coisa, chamando a manifestação do universo de "efeito ou kārya":

"(Essa Sua Liberdade) leva a cabo (ou) conduz à obtenção do que é difícil de realizar, (isto é,) do efeito --a manifestação universal-- que aparece na forma de (todos esses) sujeitos (e) objetos".

A Sua Liberdade conduz à obtenção do efeito, isto é, da manifestação universal composta de todos esses sujeitos e objetos, a qual é difícil de realizar. Sim, é certamente difícil de realizar. A manifestação universal NÃO está acontecendo em nenhum lugar ou espaço, quero dizer, não ocorreu no passado, nem ocorre no presente, nem ocorrerá no futuro. Simplesmente ocorre! Ainda assim, ninguém pode dizer quando e onde. Todo este universo foi inventado pelo seu Poder "junto com espaço e tempo", e não "no espaço e tempo". Os Guru-s geralmente ensinam que o universo está sendo manifestado "aqui e agora" como forma de explicar um processo que está além do marco espaço-temporal. Como a mente comum não pode funcionar sem a ajuda de espaço e tempo, dá-se uma explicação que seja adequada às suas inerentes limitações. De qualquer forma, a verdade é que o universo apenas aparece, mas nenhum indivíduo limitado atado a espaço e tempo pode dizer quando e onde, porque todos os "quandos" e "ondes" foram inventados em conjunção com o próprio universo. Sim, isso poderia soar muito estranho, mas estou dizendo a verdade. De fato, quando você se dá conta do próprio Ser, quando se dá conta de que "Você" está Śiva, percebe finalmente que nunca houve uma "manifestação universal" pois nada aparece ou desaparece na Sua Essência. Muito bem, não continuarei falando sobre isso, ou você poderia ficar confuso no processo.

Além dessa difícil tarefa de manifestar o universo, A Sua Liberdade na forma de Māyāśakti faz outras coisas: "Transformar o Ser em um ser limitado". Isso também é muito difícil de realizar. Depois, quando o ser limitado finalmente chega a um certo ponto de maturidade espiritual devido à Sua própria Graça, esse mesmo Poder transforma o ser limitado no ilimitado Ser novamente. Nenhum indivíduo limitado pode fazer isso por conta própria, e isso é certo! Resumindo: "Tudo está sempre relacionado à Sua Liberdade e não às ridículas ações de um indivíduo limitado que vive constantemente em escravidão, porque inclusive esse indivíduo limitado, junto com as suas miseráveis ações, também são um produto da Sua Liberdade". Pessoas que pensam que alcançarão o Ser Supremo por meio das suas limitadas ações e pensamentos são denominadas: "pessoas iludidas" ou "mūḍha-s", ou seja, pessoas sob o domínio de Moha. Moha é sinônimo de Māyā. Na realidade, o Grande Senhor sempre fará como Ele desejar. Nunca pode ser forçado pelas ações de um indivíduo limitado a revelar-se a ele. Essa é a coisa mais difícil de engolir no caso de um indivíduo limitado: Que as suas práticas espirituais não estão forçando o Senhor a fazer isso ou aquilo. São um mero entretenimento enquanto Ele decide o que fará depois!

Essa é razões pelas quais nunca estou interessado em práticas espirituais e, quando dou uma a alguém, é apenas para mantê-lo ocupado com alguma atividade enquanto o processo de Graça ocorre pelo Seu próprio Livre Arbítrio. O ego "precisa" fazer algo, pois está convencido de que é a causa dos efeitos. Mas o efeito chamado "libertação final" é demasiado imenso para o ego manejar. Como resultado, o ego é absolutamente impotente em relação a isso, mas, devido à "auto-ilusão" insiste em fazer "algo" para alcançar o Senhor "tão rápido quanto possível". O astuto Guru o manterá ocupado com algumas práticas então. Então, tudo tem sempre a ver com a Sua Liberdade, e não com as ações de uma pessoa limitada!Return

5  Embora o comentarista diga "māyā", lembre-se que, nesse contexto, isso sempre significa "Māyāśakti", e NÃO Māyātattva (um subproduto da Sua Māyāśakti ou Liberdade para gerar dualidade). Como estabelece a estrofe, a Māyāśakti é o Poder de Auto-ocultação do Senhor Śiva para que Ele possa assumir o estado indivíduo limitado "pelo Seu próprio Livre Arbítrio". Preste atenção a estas palavras: "pelo Seu próprio Livre Arbítrio". Da mesma maneira em que Ele assumiu limitação "pelo Seu próprio Livre Arbítrio", assumirá Liberdade "pelo seu próprio Livre Arbítrio" novamente. Então, o "fazer" de um indivíduo limitado é inútil no que se refere ao processo de libertação final, já que esse processo é simplesmente colossal! Para ver como funciona o Poder de Auto-ocultação de Śiva na prática, pegue um espelho e ponha-o na sua frente. Olhe para o homem ou mulher refletido nele. Bem, esse indivíduo limitado que você pode ver... NÃO é Você! Simples verdade! O que você está vendo é uma invenção da Sua Māyāśakti. Ela criou o corpo e o indivíduo que mora "dentro" do corpo. Quero dizer, já que o Você É realmente não está atado a espaço, aquele que mora "dentro" do corpo também não pode ser o Verdadeiro Você, e sim outra inventção da Sua própria Liberdade. Onde está Você, então? Em todo lugar e em nenhum lugar, porque a Sua essência está sempre além de tudo o que tem a ver com espaço e tempo. E o mesmo é verdadeiro com relação a tempo. Você parece estar em frente a esse espelho "agora" (no exemplo), mas isso também é outra invenção da sua Māyāśakti. Quando você finalmente percebe, "sem nenhuma dúvida", que o que você considera "você" é toda uma invenção, nesse momento, dá-se conta do seu verdadeiro Ser, o seu verdadeiro "Eu". Isso se chama "libertação final", "dar-se conta do Ser", etc. Independente do nome, a experiência é sempre a mesma coisa: "Liberdade!".

Enquanto não se der conta do Ser, você permanecerá como um indivíduo limitado ou paśu que está sempre "com problemas", quer viva na Argentina, China, EUA, a lua, outra galáxia, etc., quer seja rico, pobre, etc., quer o seu corpo seja lindo, normal, extremamente feio, etc. Tudo isso é mera auto-ilusão, obviamente, e, em consequência, nenhuma Bem-aventurança surgirá como resultado. Esse Poder de Auto-ocultação de Śiva (Você!) também é denominado ocultação da sua natureza essencial (o Ser de tudo). Tal majestosa ocultação é formada por três mala-s ou impurezas: Āṇavamala (o mala que produz falta de Plenitude), Māyīyamala (o mala que dissemina diferenças) e Kārmamala (o mala que faz com que se sinta um fazedor de ações). Muito bem, como costumo dizer: Chega disso por enquanto!Return

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 Informação adicional

Gabriel Pradīpaka

Este documento foi concebido por Gabriel Pradīpaka, um dos dois fundadores deste site, e guru espiritual versado em idioma Sânscrito e filosofia Trika.

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